sábado, 28 de março de 2015

Seção Parental


 "NÔMADES" 


[Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver.] 
 - AMIR KLINK - 


[Em dias contemporâneos, ainda há gente assim. São aqueles que se voltam para sua própria natureza, mutável como são as transformações do universo. Não chega a ser um cumprimento a uma determinada lei, o é por naturalidade, coisa espontânea, reflexo incondicionado. Nem mais se discorre sobre isso, tal a sua normalidade, apesar de raro. Repugnância à submissão, abomináveis costumes e tradições conservadores. Ignora-se a existência e o sentido das estradas, das águas, dos céus. Não, não e não. É por tudo isso e muito mais ainda que eu não permaneço. Até fico mais do que deveria às vezes, um pouco além dos meus limites, reconheço. Mas chega a hora de partir. Ir embora de uma residência, de um bairro, de uma cidade, de um país. Largar uma profissão, um hobby, uma mania, uma dependência qualquer. Desfazer-se de uma tradição, um costume, uma rotina. Dar adeus ao coleguismo, a uma amizade, um vínculo relacional, um parentesco, à própria família. Afastar-se de um animal, um canto, uma catarse, um equilíbrio. Romper os laços havidos com um sentimento, um afeto, uma vontade, um desejo, um sonho, uma utopia. Encerrar um espaço, uma festa, sensações e pensamentos. Não há hora certa para isso, pois não é questão de tempo. O tempo, começa depois da partida. O mundo é um labirinto de nascentes, a maioria escondidas, sem devermos procurá-las, posto que nos cabe é apenas estar lá fora. As tais novas possibilidades, existem sim, desde que nos tornemos novos, renasçamos, nos disponhamos a tanto. Cinco décadas, e eu me sentindo tão novo quanto eu concebo os meus princípios. Eu vi muita coisa, senti pouco. Havia muita sensibilidade em mim para que eu pudesse considerar qualquer sentir relevante. Então, eu cheguei novamente à beira da minha sempre estrada. É aqui, sobre o caminho, que eu me realizo em ações, depois da remissão dos quartos, teclados e pesares relacionais intentados. A extensão do meu eu não se deu da boca pra fora, e sim das mãos para frente. Escrevi demais, até provocar uma lesão de esforço repetitivo em minha consciência. É vez de me licenciar de mim mesmo, de não contração. Acompanhar as leis cósmicas, expandir para libertar. Nem sei para onde vou. Porque todo nômade, não possui lugar para amar, seu espaço é o movimento, onde não cabem quaisquer despedidas. Depois da temporada de recolhimento, onde o turbilhão de palavras servia para concentrar energias no encontro do autoconhecimento, agora é botar à prova o aprendizado, conseguido a duras penas lidando com indiferenças, silêncios, distâncias, ausências e não empatias. Paradoxo, mas isso tudo fortalece, apura o discernimento e alumia a vida não apenas ao nosso redor, mas principalmente mostra o que havia por dentro: ninguém, ao lado de tudo. O nômade não busca um alguém. Ele apenas vai, sem ninguém, por consideração àquele tudo...]  
 - DIAMOND FISHER - 


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