terça-feira, 11 de março de 2014

Tribuna Inestoica




 DEIXEM HELENA
Uma época. Permanecemos quietos em nossos lares, tentando sossegar a alma diuturnamente atingida pelas vicissitudes do caos sociológico de relações. Eis que, inadvertidamente, aparece alguém em nome de sua boa ação, ingenuamente imbuído da mais nobre tentativa em complementar-nos, como se amputados fossemos. O mundo ideal é par, junto, casal, estabelece vínculos como condição de sobrevivência. Mãos dadas, a emblemática imagem que sela a modernidade dos relacionamentos felizes na cidade. Alguém sozinho, milhas distante do padrão contido na cartilha dos cupidos sem asa nem noção, está completamente às margens da sociedade modelo. É um ser afastado, deveras rude, idiota talvez, sobre o qual deve recair todo e qualquer preconceito. Seu destino: o banimento. Só há uma salvação que o permita inserir-se novamente no seio comunitário, a união com alguém. Não importa quem seja, como seja ou qual a razão de ser disso. O que interessa, são os dois, determinados matematicamente. Aquilo que os une, fica em terceiro plano. O que não se admite, é a solidão. Sim, todos os sozinhos são solitários, pois não amam ninguém, não gostam de nada e fazem jus ao seu recolhimento afetivo. Gente estranha, cheia de defeitos, deve ter suas parcas qualidades dirimidas ante a simples escolha de refugiar-se neste enorme planeta tão cheio de possibilidades. Erro grosseiro, a ser reparado antes que a morte apareça como troféu de merecimento. Para tanto, preceitos religiosos indicam o caminho, a ser traçado na base de dádivas, ofertas e doações, de tudo aquilo que se possa ter, inclusive alienar sentimentos... A mulher, complementação do homem e vice-versa. Diante disso, as pessoas apresentam uns aos outros, torcendo para que dê certo, ignorando que em considerável número de casos, as consequências não passam de meras conveniências, as quais são oficializadas mas não assumidas publicamente. Juntos na praça, no shopping, nos restaurantes e no baile horizontal dos suores. Distantes nas perspectivas... Oh mundo de Homero, transformando os sujeitos em embalagens casadas de produtos de naturezas completamente diferentes. O braço é colocado à disposição, para ser torcido a qualquer momento de dificuldade, conflito de vontades ou decisão. Na sequência, os outros membros. Depois disso, os órgãos internos, até culminar com a alma. A submissão como regra, evitando desgastar mais o que já nasceu de atrito, forçando aquilo que deveria ocorre naturalmente. Única exceção, faz-se ao amor verdadeiro, pois deste não se fala e nada se escreve, apenas se vive, o que é plenamente louvável e deve ser substancialmente reconhecido. O resto, é especulação travestida de amor, um amor inventado, supletivo, falso. Fantasias velhas, rasgadas e démodé, que alguns usam querendo demonstrar estabilidade, bons tempos e, claro, a tal felicidade. Aparências, nada além. Na próxima, desligarei a luz. Assim, ninguém perceberá que estou aqui, tranquilo em meu lugar. Poupar-me-ei de magoar alguém num encontro marcado por estes funestos agentes de acasalamentos de índole terapêutica, fazendo com que eu e ela permaneçamos distantes de nós, mas muito próximos de nossa individualidade, autonomia e independência sentimental. Pois eu continuo gostando dos meus próximos. Pois eu continuo amando a vida, contemplando as estrelas e sonhando com o mar. Acompanhando à beira do rio, no pé da montanha sob o mesmo sol dos helenos, os dias melhores que estão vindo. Mas se você, agente enviado de Odisseu, me encontrar caminhando a sós pela rua, não hesite ao menos em me cumprimentar. Prossiga reto depois disso, levando consigo e para longe de mim seu dualismo, jeito magneticamente polarizado de achar que a vida não precisa ser pensada, podendo ser forçosa e artificiosamente provocada ao invés de obedecer a espontaneidade dos fatos, à não casualidade dos encontros, o destino. O teatro, é para os profissionais. O resto, nem amadorismo poderia ser...  

segunda-feira, 10 de março de 2014

Formato Mínimo / Encerramento


 Diamond Fisher 

 "Repto Desiderato" 

 [Se ele me questionasse sobre um assunto que não comentamos 
 Eu lhe diria que faltou perguntar-me o que é o amor... 
 Responderia que o amor era o vento 
 Um vento que sopra a partir do coração 
 Quando nasce, 
 Sublima tornando-se capaz de atravessar continentes 
 E quando encerra-se, 
 Condensa até precipitar feito orvalho sob as pálpebras.. 
 Mas nós nem conversamos 
 Permanecem mesmos os estados físicos 
 E eu ainda nem amei...] 


****

 "Canção em Volta do Fogo" 
 Uns & Outros 
 por Henrique de Oliveira 


 "Se o amor então se cansou 
 Durma que a lua eu vigio 
 Se o céu te parece ruir em pedaços de vidro 
 Dançaremos em volta do fogo 
 Subiremos com a maré 
 E amanheceremos de novo 
 Se o nosso olhar se perder 
 Em horizontes tão estranhos 
 E o mundo insistir em girar 
 Como numa ciranda 
 Deixaremos as luzes acesas 
 E abriremos as portas da casa 
 Para termos então a certeza 
 E toda noite será 
 Eterna como um sonho 
 Que insistimos em ter 
 Então durma, durma 
 Que o dia não demora a sangrar 
 Com o canto do primeiro galo 
 Então durma, durma 
 Que o dia não demora a sangrar 
 Quando o primeiro galo cantar" 




domingo, 9 de março de 2014

Flagrantes da I-n-t-e-r-s-u-b-j-e-t-i-v-i-d-a-d-e




-“Boa noite. Ele está?” 

-“Puxa, essa hora...tudo bem. Olha...faz tempo que ele foi embora.” 

-“Quando foi isso?” 

-“Bem...acho que no ano passado, talvez.” 

-“A senhora não sabe para onde ele foi?” 

-“Não...mas acho que ele foi pra bem longe, nunca mais ouvi falar.” 

-“Tem alguma referência, um telefone ou sabe de alguém que possa me informar?” 

-“Nada...” – e a moça ficou no portão sem saber o que fazer. 

-“Dá licença, moça, é muito tarde e eu estou ocupada, até.” 

-“Mas espere um pouco...” – ela não tinha mais o que dizer, restou acompanhar a senhora fechar aquela porta. 


 Voltou-se para a rua, encostou-se na lateral do carro e ficou até sem saber o que pensar. Esse vazio que agora tomava conta, era um espaço que ela não havia ocupado adequadamente e no tempo certo. Pois um dos maiores erros que se pode cometer na vida, é deixar de querer quem se tem. A questão é que só iremos descobrir isto, quando nossas ilusões vão embora, tornando nossa casa de sentimentos, um imenso mas inevitável vácuo. Então tardiamente imaginamos conversar com alguém, uma determinada senhora, chamada consciência.. 




 "A THOUSAND YEARS"  /  Christina Perri  /  by Piano Guys 


Navegando em Continentes






AUTORALLIA << Moderna Idade / por Neruda Paulífero




MODERNA IDADE 
Chegou o tempo em que todos à tua volta têm razão. Porque eles explicam com soberba desenvoltura todas as coisas de tua vida. Apontam teus erros como quem avista um cão abandonado na avenida. Elencam as causas de tuas questões como quem faz uma lista para o supermercado. Por fim, atribuem a ti, e não à existência da condição humana, as consequências outrora semeadas para teu assim presente. O leitoso clímax da racionalidade esparramando-se pelas salas, nas mesas e demais cômodos de uma casa que nem é tua. Com facilidade, lançam no ar cheiros daquilo que não é preciso discutir, e que ouves por complacência. Das premissas às suposições passando pelo especular sideral, o senso comum perde compostura e vergonha, abre a braguilha e te mostra a visão crua da realidade alheia como ele sempre vê de cima. Seriam apenas argumentos engendrados? Ou nada mais do que inalienáveis conselhos? Consagradamente, a oratória é o instrumento de controle mais antigo de persuasão, só perdendo para a força braçal. Louvores a tudo isso, posto que é intersubjetividade. Mas lamentável, porque jamais te convencerá, qualquer coisa que ignore a emoção, a tua emoção. Ela te diferencia, segrega e isola, mas ao mesmo tempo te guia, sustenta e eleva, na direção de tua paz. Não levarás ninguém contigo, além da tua verdade, incompreensível para todo aquele que não te sente. Lutas também contra isso, que não precisarás vencer, nem os doutos arautos do achar muito menos os tardios eloquentes de cuspir, todos mestres da academia não reconhecida pelo ministério da razoabilidade. De tão abusiva a ingerência, que as palavras já não deixam de sucumbir à má qualidade do contar. Pois refletir, é algo mesmo emocionante... 


quinta-feira, 6 de março de 2014

phOTOCALIGRAfIA



phOTOCALIGRAfIA



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KAMASUTRA


 "THE FOOL ON THE HILL" 
 LENNON & McCARTNEY 
 by BASEMENT ALCHEMY COVER 




 ORA, DIREIS  -  por Menelau Ibidem 

Era uma vez, um homem na colina. Ele passou a acreditar em um novo tipo de amor que lhe contaram existir, um amor sem reciprocidade. Sentia-se feliz, e sua independência o conduzia pelos mais belos campos do sentimento. O tempo, senhor dos estigmas, passava por ele no mais absoluto silêncio. Até que um dia, ele percebeu que construía nada mais do que uma bela estória. Uma simpática crônica da vida, traduzida em sons emprestados e palavras combinadas, a qual preencheu as páginas em branco do seu querer, colorindo figuras amorfas, não delineadas e insípidas, um tanto caricatas. Para ele, o homem na colina, era o bastante. Nesse dia, a revelação se deu por um lapso, quando ele percebeu que o tempo já não mais estava ali, tinha ido embora levando o sentido das coisas. Momento em que a lágrima rolou do seu olho esquerdo, deslizou pela face passando pelo canto da boca saindo do rosto, mas não caiu sobre seu peito. Ela evanesceu-se no ponto equidistante entre a mente e o coração, que alguns chamam de consciência. Aconteceu o que era preciso e urgente, mudando os estados físicos de todos os componentes daquela narrativa, ao final da sublimação do tal amor que então virou éter. De tudo, que antes era guia, se fez gás nobre, elevando-se e sendo levado pela corrente do vento na direção do nunca, justamente pela ausência de sentidos. Tolo, ele olhou por um instante ao seu redor procurando algum lamento, não encontrou. Tentou avistar a tristeza, que também não estava. Por último, quis saber de si mesmo a resposta, e foi prontamente atendido. Enquanto o tempo senhor dos estigmas passava por ele, trazia simultaneamente sem perceber, a cura. Porque na vida, há também outras coisas que não são doenças mas necessitam de cura. Como no exemplo desta pequena e incomum estória, de alguém inteligente e sonhador, que foi naquele tempo morar no alto de uma colina tentando viver as estrelas...