domingo, 15 de outubro de 2017

Mundo Refil











Mundo Refil 
Antigamente, Lady Francisco atingia o orgasmo em quarenta segundos com uma chaleira de água quente. Cláudio Cavalcante fazia fendas em melancias. Fantasias condicionadas à penúria das realidades de cada um. Ou será que não é assim? Você fantasia que tipo de impossível? Algo que está além de seu alcance? Aquele homem com quem você já transou ou aquela mulher que transou com você. Se não é alguém do passado... seu desejo volta-se para quem ainda não transou contigo? Você conhece mas ainda não deu liga. Talvez nem conheça bem, mas cairia bem na sua cama. Tem também os desconhecidos dos sites especialistas da WWW. Ou então é quem não existe, o que fica um tanto difícil e complicado psicologicamente. Alguém do seu sexo. Um transgênero, pode ser? As pessoas sempre levam em seu bagageiro do prazer, as mesmas pessoas? O imaginário é limitado? Parece-se com o real, ou seja, pouca gente... ou muita gente... como é o seu arcabouço íntimo das horas particularíssimas de manipulação orgânica? Quem são os habitantes desta seleta casta onírica que povoa seus momentos “I feel myself”? Digo isso partindo do pressuposto que você se satisfaz sozinha, ou complementa sua satisfação mesmo tendo alguém. Um profissional? Não, acho que você não faria esse tipo de contrato. Mas você pode ser uma daquelas pessoas que sempre tem uma amiga, ou um amigo, que possui um amante fixo, à disposição a qualquer hora que você necessite de sexo, é o que você conta. Você fala que é a amiga, disfarçando muito mal que não é você. O amante. Seu amante. Ele vai até sua casa, um beijinho discreto no canto da boca e um vinho para você se soltar (dos seus próprios medos). Ele pede para ir ao banheiro, precisa limpar a bunda para não pagar mico que comeu muita rabanada no almoço. Na volta, sempre há uma cueca nova e você já está com a mesma lingerie reservada para ele, que tira a calça e começa o ritual. Entregam-se sem muito beijo na boca – as prostitutas também não gostam, pois beijo na boca revela intimidade, coisa que elas resguardam, assim como você; elas por direito, você por honra, isto sem comparação de comportamentos, apenas para demonstrar a similaridade no trato da própria personalidade da pessoa humana – até você atingir o clímax. Caso ele não seja egoísta nem precoce, uma masturbação final lhe vale o ingresso. Alguns minutos lado a lado, filosofando sobre a vida não animal e levantam-se para a higiene pós-coito, sua mão está suja de branco e o pênis dele grudento, vocês não usam camisinha, que bom seria se ele suasse menos. Tarde da noite, seu soninho já veio e você manda ele dormir num quarto ao lado, pois sua madrugada também é resguardada: corpos não ocupam lugares de almas. Na manhã, a despedida de quem veio para fazer a prestação de um serviço sem recibo. Foi bom, vocês gozaram outra vez, a libido permanente diminui de circulação, volta para a toca. Na verdade, é a ansiedade que aumenta seu tesão. E o sexo não resolve a ansiedade. Ele é apenas uma fuga dos teus outros medos. Você ocupa o tempo fazendo exercícios corporais com alguém-objeto, achando que isso faz bem para o espírito, coisa tão longe quando você e o resto do mundo transa. Está chovendo lá fora e do lado de dentro de sua janela da sala, alguma gotas de arrependimento que emanam de sua consciência evaporam no vidro, lá embaixo o amante embarca na sobrevivência dele, retornando aos medos dele. Há tantos que se submetem a esse ou outros tipos semelhantes de relacionamento, que o costume social afasta solidões. É um afastamento temporário. Fantasiando sozinha ou usando alguém, não importa, o medo de amar é onipresente...  

Incidental: no restante da manhã, músicas como essa para limpar a noite passada... 

Telefone (Tim Maia) - Bibiana Petek com Tati Portella 




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