segunda-feira, 30 de maio de 2016

Sessão L'Archipel




- elas são muitas. mas na história de cada um, existe uma principal. de tal maneira, que se considera incomparável, as outras são as outras e só. escrevo sobre as Sandras. ou melhor, sobre uma só. a Sandra da minha história. 



De Temps En Temps 

 /Era uma vez...desde cedo, sentada na turma do outro lado daquela sala na Aliança, seu olhar tímido não escondia o sorriso. Morena, brasileiríssima demais. Não chegava a parar o trânsito, só porque era discreta. Nas roupas, na postura, no comportamento. E também nos sorrisos, não eram para todos. Uma pessoa reservada, digna de conhecê-la para saber mais. Mais do mundo. 
 Ela, La Blonde, Vanessa e ele formaram um grupinho legal naquele semestre. Ultrapassaram as fronteiras do liceu francês ali da Prudente de Moraes. Alguns aniversários, bares, casamentos. La Blonde, apaixonada por Marcelo, dali também. Vanessa, carregando seus cinco fãs a tiracolo, e muitas dúvidas sobre qual deveria escolher, perguntava o absurdo, amava ninguém e vice-versa. Ele, sempre sozinho por naturalidade, fazia curso integral que só lhe disponibilizava à noite. 
 Sandra, estava noiva na época. Ele não sabia se os olhares que desviavam nas paredes da sala quando ele a fitava, era por isso, pelo noivado e as suas regras. Mas a aproximação foi inevitável. Tinha aquele algo a ver, e não era raso. A coisa que marcou foram as risadas dela, na presença das brincadeiras dele. Uma segunda, impublicável.
 A noite, a cama e a relação conturbada. Pudera, a insegurança dela tinha conteúdo, motivação, fundamento. Ele respeitou, afinal, chegara depois do outro. 
 E assim se lançaram no tempo. Intervalos enormes caíam por terra quando se reencontravam. Na praia, ela sem pudores, quase livre. Mas um quase que praticamente se eternizou. E ele sempre respeitando. 
 Dia desses, ele resolveu voltar em algum lugar do passado. Não houve explicação para ter feito isso. Chegou lá, o porteiro disse que ela havia se mudado há alguns meses, junto com um sujeito. Presumiu relação. Lamentou o atraso. Não desistiu, foi atrás até que conseguiu. 
 A ligação e a mesma risada. Outras brincadeiras ele trouxe, para novos sorrisos. Ela contou muito, do seu momento, de sua escolha, vivia agora reservadamente em tempo e espaço, e gentes. Combinaram algum encontro, não deu certo. Provavelmente, o receio dela voltou à tona, mesmo tendo ele lhe assegurado da ausência de intenções. Não era pra medo, ele só queria revê-la.  
 Mas os tempos mudaram muito e com isso as pessoas também. Hoje, todo mundo acha que ninguém mais faz algo sem querer alguma outra coisa em troca, pode ser o que for. É uma pena. Isso afasta a própria condição humana, remetendo os seres a um habitat essencialmente animalesco, selvagem, capital. Inóspito para confraternização, amizades e coisas afins. Quem dirá, para simples ou importantes reencontros. 
 O passado, cada vez mais se torna, mais do que um livro, um verdadeiro espaço deste livro na estante, não sendo de bom alvitre demorar-se com ele, o livro, fora do lugar. Poeira do pretérito, é o que chamam e generalizam, no caso do livro ser aberto, e colocado novamente em cima da mesa, novamente dentro da pasta, novamente dentro do peito. Por mais que isto traga boas lembranças. E por mais que aquele tempo não tenha sido vivido direito, ou adequadamente, sem importar as razões. Pois foi um tempo, acompanhado de espaços proibidos. 
 Nos dia de hoje, revisitar parece ofensivo. Tão apertados estão os livros na biblioteca, periga cair a estante, a casa, o mundo, o próprio tempo. 
 E de tempos em tempos, chega um dia em que o espaço acaba. Mas naquela sala, a memória dos bons momentos jamais se apagará. L’archipel ficou distante, continuamos a boiar no mar das relações interrompidas pela modernidade./ 



 Não houve aliança. 
 Ela, teve o seu motivo para não ter vindo 
 Ele também, por ter voltado.. 
 Tantas ilhas naquele arquipélago, 
 Que ambos, 
     perderam-se entre os arrecifes. 
 O continente, era logo ali... 



"De Temps En Temps" - Grégory Lemarchal




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