terça-feira, 30 de junho de 2015

QUADROPHENIA - IS THIS LOVE / BOB MARLEY


 "Em última análise, amam-se os nossos desejos, e não o objeto desses desejos." 


 SELIA 

 TOREE McGEE & BEN COOPER 

 BILAL 

 RIHANNA 




Contos da Estação Tubo



Não faço crônicas. Minhas crônicas são na verdade, súplicas paranaenses. Neste Estado onde a copa das Araucárias é tão alta, sábia natureza que não quer fazer sombra a um gélido povo que necessita demais de luz, ectópicos esquimós na vereda subtropicália. Não há barreiras naturais para o frio que vem de fora, então os artificialismos dominam o ambiente, os lares e as casamatas. Inevitavelmente, a baixa temperatura acondiciona-se nos organismos, fazendo com que cada um tenha seu lócus na escala Celsius, beirando o cardinal zero. Gente defesa, proibida, impedida de aquecer a própria vida. No meio disso tudo, eu dissipo minha energia sobre letras brancas em teclas pretas numa cidade sem cor. Tento desenhar o que eu queria. Apagar o que eu abomino. Esboçar o impossível, as possibilidades não me atraem. Assim como os livros de autoajuda, os pastéis de queijo, as novelas e os óculos Rayban: tudo isso que engorda, maioria que deteriora a democracia, aquela teoria que em tese regozijaria. Inverno que não é só agora, desfila o ano todo congelando pensamentos, atitudes e prospecções: como chegar lá sem o primeiro passo. Então o conservadorismo habitou-se no meio, o olhar não desce, os elos não prendem, predomina o desrespeito que advém do inadmissível; as relações sociais, não são mais que dissimulações. Ter um perfil em rede social é empunhar-se de um escudo, armadura revolucionariamente tecnológica que não disfarça o medievo jeito de não ser. O virtual é seguro, ignorando os sentidos do tato, do olfato, do paladar e até da visão e da audição, ratificando a frieza dos cidadãos planaltinos: um casamento clandestino que moralmente deu certo, não obstante não haja nudez nem beleza. As pessoas deturpam a suficiência das coisas, satisfazendo-se com o que não têm, com o que já tiveram e claro, com o que sobrou. A rua da frente parece tão distante, a pracinha tão longe, o café uma estrada sem fim. Mas à noite tem world wide web na TV de mão. Não, o dia todo tem isso. Para que um encontro? Se eu posso digitar ideias – mesmo que superficiais – postar imagens – mesmo que incompletas – enviar símbolos – mesmo que inadequados. Sim, a internet não é o sol que as Araucárias queriam. Elas clamam por ele a cada novo amanhecer. Mas as gentes insistem em focar no paisagismo artificioso do (des)convívio. Enfim, encontraram um jeito supletivo de compensar a falta de calor humano. Vizinhos? Para que vizinhos, se eu posso fechar a minha porta para minha própria vida e abrir uma janela de ninguém para o mundo inteiro? Enfim, a consolidação das distâncias esfaqueou as presenças, a violência das indiferenças atirou nas afinidades, a vitória das minimizações aleijou as importâncias, a soberania do medo esquartejou os carinhos e a supremacia dos silêncios matou as esperanças. Mundo, tão grande mundo que se apequena num cosmo particular, tão invaginado quanto o clima da estação, tão virgem quanto somos de amar...


segunda-feira, 29 de junho de 2015

Contos de Domingo




Tarde da noite. O carnaval era arredio para aquela gente, tempo de fuga para bem longe do planalto que substituía marchinhas por zumbis e pagodes por psicodelismo. Um sábado, já na madrugada de domingo, na casa de esquina de um bairro próximo ao centro, onde restou apenas um cão velho a ladrar no vazio soturno da lua encoberta. Dois, um permaneceu no carro e o outro pulou o muro. Um silenciador na ponta da pistola paraguaia surpreendeu a marginária classe e funcionou na fronte do pobre animal quando ele partiu para cima do meliante. Ninguém viu nem ouviu que o sangue daquele Cane Corso coloriu a superfície das lajotas do pátio dos fundos, fazendo rios dos rejuntes. A luz intermitente, insuficiente para caracterizar presença. Uma lâmina cortou um vidro, que estourou o ingênuo cadeado de uma porta lateral qualquer da residência que não tinha alarme só para não alimentar o mercado que mais houvera crescido nos últimos anos, o da segurança privada: novas vítimas para uma resistente ideologia. A pequena lanterna do invasor de lares descuidados iluminava o piso vinílico. Foi direto ao quarto, onde deveriam estar os valores mais protegidos. De repente, o susto do ladrão: no chão, à frente da cama, uma mão humana cortada e ainda, lentamente, pingando sangue no tapetinho aos pés da cama de casal. Olhou em volta, nada que justificasse aquilo. Tinha uma mão no meio do caminho do ladrão. Num país árabe, distante dali, era o que faziam com os assaltantes. Mas ele não sabia disso. O cheiro morno da hemoglobina sódica aquecia as narinas do pasmado vigarista. Não havia o restante do corpo, procurou sem sucesso. Eis que ele sentiu uma respiração vinda de dentro do closet. Então, ouviu o característico engatilhar de uma 9mm. Hesitou. Tremeu. Calou, o covarde. Pensou que se desse um passo para qualquer direção, a bala o atingiria sem pestanejar. Sua sobrevida entrou feito um carrossel em sua mente. Coisas da hora da morte, isso ele sabia. Os vinte anos de favela, os dois assassinatos, o latrocínio do arquiteto, a imunodeficiência contraída no cárcere, a violência com a própria amada, a desqualificação, o desemprego, a corrupção generalizada. Aquela sociedade toda, haveria um dia de se suicidar. Ele nunca teve nada a perder, já que nunca tivera nada. a reinserção social como objetivo da pena era tão absurda quanto as justificativas que os governantes têm para direcionar orçamentos anuais ao erário público. Reinserir quem jamais fora inserido uma única vez. Novelas que saem da programação e invadem as gestões dos maus administradores. E o filme continuava. Seu filho bastardo em Santa Catarina, o pai entregue ao crack, a mãe alcoólatra, três irmãos mortos pela PM no assalto à lotérica. Seu currículo criminal virando páginas. Taquicardia, sudorese, tremores, reconheceu a hora de sua partida, o que não possibilitou às suas vítimas queima-roupa. Vinte e cinco anos em dois minutos, um clímax de rotações. José Maria enfim tombou sua última morte sobre a cama. Um tiro na boca ricocheteou na mandíbula e se alojou na occipital. O comparsa escafedeu-se após o estampido. A mão era um símbolo projetado pela sua inconsciência econômico-político-social. Amputada, significava a falta de elo entre o Poder Público e o cidadão. Tantos Zés-Marias formam-se a cada ano nas penitenciárias, porque a contemporaneidade não abandona o medievo. Medieval, é a capacidade dos homens públicos em combater a desigualdade social apostando e investindo recursos alheios em sistemas fracassados de correção. Como exigir moral, ética e sociabilidade, de quem não tem um mínimo desses valores? O Governador, naquele exato momento, limpava suas narinas e o pênis ao fim de mais uma festa regada à cocaína e menores de idade no interior do Estado, pensavam que ele estava no litoral: o discurso. Políticos discursam para uma população representada pelos três macacos. Os exilados da Capela ainda não conseguiram evoluir politizações. É a democracia se encaminhando para o serviço de pronto socorro. Somos, todos, zumbis melhorados. E ainda displicentes diante dos feriados, também das urnas. É urgente contextualizar. Por isso, é muito difícil saber votar... 

 - Ô moço! Quem atirou? 
 - Não sei, minha senhora. Só sei que era um eleitor... 





sábado, 27 de junho de 2015

Tributo a um Estranho




Oi. Guardo por aqui algumas palavras que não lhe direi. Assim como eu, elas não têm lugar em espaço algum ao seu redor, nunca tivemos. Inicio pela conclusão final: eu sempre respeitei a sua escolha. Podemos mudar o mundo, mas não a escolha de cada um. Seu caminho era vicinal, desde cedo, afastando-se do núcleo familiar. O entorpecimento de sua liberdade, deu-lhe asas para bem longe dali, do lar. A ação química atingiu substancialmente deteriorando a região cerebral responsável pelo afeto, juntando isso ao seu livre arbítrio, deu no que daria, inevitavelmente. Protegido pelo pai, em tantas situações, você tinha determinada liberdade para se soltar além das amarras que não tinha. Mas eu lembro algumas coisas. Quando por exemplo você não ia para a aula e pedia quase perto da hora do almoço para eu ir buscar o jornal na casa da avó. Quando a gente batia um futebolzinho de “três sem cair” no portão como gol.  Quando você me levou com seus amigos para a Ilha do Mel, paraíso que se tornou o laico santuário da minha juventude careta. E quando você me enviou alguns cruzeiros uma vez que passei fome na Marinha. Mas foi só. De lembranças boas, mais nada. Uma intermediária, no dia em que o pai faleceu, eu demorei a lhe encontrar, queria lhe dar um abraço e pedir para você me ajudar a terminar minha adolescência sem pai. Eu não queria que você fosse meu pai, apenas queria alguém mais velho a me orientar. A demora a lhe encontrar naquele fatídico dia, era um presságio: nós não seguiríamos juntos na continuidade da vida. Então, eu me recolhi. Você aprontava, me ensinando sem querer que o mundo deveria ser o seu contrário. Sua eterna alegação de ser “cabeça-feita”, não interferindo em nenhuma decisão que a família precisasse tomar, demorou a chegar em minha consciência como omissão. Depois disso, uma omissão pela ausência de vontade de sua parte. Enfim, tudo isso houve de ser compreendido, engolido a seco, mesmo sem digestão. Tardou um pouco, mas suas asas foram ganhando tamanho e força, através do trabalho. Reconhecido foi o seu valor profissional, o que não afastou a desvalorização que você fez de nós todos. Mundo das opções, vontades, seguimentos divergentes. Paralelamente, e principalmente em relação a mim, prevaleceu seu caráter de operador do Direito: acusou, julgou e sentenciou-me sem contraditório nem ampla defesa. Uma fofoca ali, outra mentira acolá, foram suficientes para que você me isolasse por definitivo de sua convivência. E dizem que a pior morte é daquilo que continua vivo, é mesmo. Certa vez, combinei um papo em sua casa, para conversarmos algo importante em relação à mãe. Você não foi. Você havia desistido de nós, há muito. Paradoxo, sua única escolha me envolvendo, foi de padrinho para sua filha, impedida de conviver conosco e doutrinada ao isolamento e distância que você estabeleceu na sequência. Nem me convidaram para a festa de 15 anos dela: eu tenho uma sobrinha que eu nunca pude ter. Inteligente a sua menina, vejo nela uma boa conversa e um futuro promissor, ao mesmo tempo em que sinto que ela não me considera um tio. Contraste, fruto de sua orientação segregadora para conosco. Novamente, a necessidade de reconhecer escolhas. Como se fôssemos todos frutos passados em uma barraca de feira, a minimização de relações parentescas em prol do estigma inventado sem argumento, propriedade ou fundamento. Sinto muita pena de minhas filhas não o sentirem como parente, mas ensinei bastante a elas sobre as coisas de rejeição.  De lá para cá, você não consegue me olhar nos olhos. Cabeça baixa, desvios, comportamento defeso como se eu fosse um meliante na iminência de um ataque de toda e qualquer natureza. Então, meu caro, vim aqui para registrar que não é questão de perdão, posto que não sou religioso. É somente um desabafo, na catarse de exteriorizar um pensamento que se consolidou pela morte de um sentimento, provocado pela sua livre e espontânea vontade. Aquelas substâncias, liberam os centros frenadores do organismo: naquela outra fatídica noite de carnaval na Ilha, você revelou o que não sentia por mim. A violência é uma de suas marcas características. Não conseguiu a física naquela oportunidade, mas conquistou a violência do silêncio, da lonjura, da mudez, da descompanhia no curso do tempo. Tudo em razão de uma condenação extrajudicial, arbitrária, baseada em depoimentos de testemunhas, a mais prostituta das provas. Quem diria, meu caro, um Bacharel processar um parente próximo nestas condições, hem? Mas eu não levo comigo rancor, mágoa, ressentimento, ódio, raiva ou outra coisa dessa natureza. Só porque foi escolha sua. Até hoje torço por você, da mesma forma que fiquei em casa torcendo pela sua sobrevivência quando você se acidentou de carro. Nunca rezei tanto na vida, recém tínhamos perdido o pai, eu não admitiria perder você. Eu, um ser não religioso, quem diria. Mas o perdemos de outra forma. Melhor assim. Assim, quando lembro de você eu lhe envio todos os votos (não vencidos) de felicidade que não pude lhe dizer oralmente. Nunca pense que eu fui indiferente em relação à sua vida. Minha indiferença, estabeleceu-se no sentido de nossa convivência. Você e a mais velha, não gostavam de mergulhar em assuntos profundos. Por um lado, foi bom, pois me poupou de ouvir de sua boca aquilo que você sempre demonstrou em relação a nós: desprezo. Para mim, não foi um problema, já que sou forte: lamento seu distanciamento de nossa mãe, pois ela ainda precisa de você. Menos mau ele estar no ar da história, do que chegar pela exposição de suas palavras. Todo esse nada de sua parte, e eu jamais lhe condenaria. E jamais eu me disporia a uma rescisória, em função do meu respeito. Seus motivos para me ignorar foram adubo suficiente em seu campo da descobertas, formando seu livre convencimento: cumpra-se. Doutro lado, mas bem longe, é o que me cumpre participar. Pois se eu não tivesse a fraternidade como valor, eu agiria tal qual você. Orgulho pelo seu sucesso profissional, coladinho com o lamento pelo fracasso relacional. Pena que não compartilhamos juntos nosso maior amor: o Atlético. Em seu lugar na prateleira de meu passado, há um livro incompleto, abandonado logo após os primeiros capítulos. A capa era bonita, tinha essa foto aí em cima, tempo em que você olhava pra mim e sorria. A vida não faz isso com a gente, nós é que fazemos isso com a vida. Sério: seja feliz, homem. Mesmo que eu tenha, por consideração à sua discricionariedade, perdido a chance de lhe chamar de Irmão. 


sexta-feira, 26 de junho de 2015

Anaïs Nin Tupiniquim


 ‘Quando a pornografia invade parte de mim...’ 



 O futebol passa na tela 
 Janela fechada pro mundo da noite 
 Escrevendo o corpo dela 
 Com meu pau, 
 Caralho de açoite 


 Abra tuas asas pernas 
 Que mergulhão corto teus céus 
 Divido-te em dois sóis 
 Entre o teu gozo 
 E a nossa vida.. 


 Lábios úmidos teus 
 Bebo de teu córrego 
 Escorro até o rego 
 Nado em língua 
 O avesso de prazer 
 Do teu mundo ao contrário 
 De tudo o que podemos ser 


 Separa teu indicador 
 Junta com o médio 
 Banha-os em tua jugal 
 Aproximando mucosas 
 Rosas 
 Desabrochando teu, 
 Clitóris em flor 
 E vai de livre e soberano encontro 
 Àquilo tudo que tu gozas... 


 Um avião 
 Um automóvel 
 Uma cama 
 Dois corpos 
 Duas genitálias 
 Três orifícios 
 Quatro mãos 
 Cinco orgasmos 
 Nenhum tempo 
 Mas todos os sentidos... 


 Deita teus peitos sobre a mesa 
 Sobremesa minha 
 Buceta tesa 
 Onde a glande passeia 
 Toca pilão de paçoca 
 Piroca que te faz Rainha.. 


 Putos 
 Os prostitutos 
 Que não cobram tributos 
 Quando satisfazem egos 
 Dos amores cegos 
 Onde só cabe sexo 
 Sem espaço pra nexo 


 No sofá 
 Ela sentou no encosto 
 Em compasso de pernas 
 Abriu seu rosto 
 Cerrou os olhos 
 Gritou Brasil 
 Meu pau de anil 
 Minha puta varonil 
 Sou teu quengo vil 
 Querendo que o amor 
 Ouça independência e vida.. 


 A língua fugiu da boca 
 Correu solta 
 Pelos campos do corpo inteiro 
 Dos dedos do pé 
 Pelos mamilos rígidos 
 Até os ouvidos da alma 
 Bandida, 
 Pornográfica 
 E tão carinhosa, criminosa boca 
 Tão sorridente quando você goza. 


 Teus seios 
 Teus seios 
 Seios, 
 Sou filhote.. 
 Teus bicos 
 Teus bicos 
 Bicos, 
 Gaivota.. 
 Ícaro, sou pássaro-homem 
 Voando pelo céu de teu peito 
 Quase no sol do teu amor.. 


 Olha pro meu ventre 
 Pau duro sob a calça 
 Põe tua mão e sente 
 Carne tua 
 Pedaço meu 
 Quero que digas nua 
 Que ele já te fodeu 


 De vestido 
 Sem calcinha 
 Livre bucetinha 
 Passeia sozinha 
 Pelos becos de minha casa 
 Em noite perigosa 
 Tão gostosa 
 Não sabe que é madrinha 
 Já cuida deste abandonado 
 Tutora de felicidade minha.. 


 Falta-me teu corpo 
 Pra traduzir minha ereção 
 Explicar meu leite 
 E o sentido desse tesão 
 Vem sem medo do sexo 
 Que ele é mais um nexo 
 Pra nossa união 


 Estou saindo 
 Deixo-te em gerúndio 
 Em movimento se masturbando  
 Seus dedos exercitando.. 
 Logo estou chegando 
 E a gente de novo metendo 
 Coisas toscas falando 
 Pela pobreza que sou escrevendo 


 Toda palavra 
 Pede saliva 
 Falar de sexo sem boca 
 É escrever sem papel 
 Na idiotice da distância 
 Que tortura o desejo 
 Mas fortifica o dossel. 


 Pau 
 Liso feito mármore 
 Duro que nem xilema 
 Comeu o cu do poema 
 Pensando que era arte.. 
 Pura orgia travertina 
 Pois os covardes são de Marte 


 No chuveiro 
 Ela empinou o traseiro 
 Água quente encharcando a bunda 
 Penetração profunda 
 Galopante movimento 
 Delícia de tormento  
 Gozar junto com a amante.. 


 Estas frases são 
 Ejaculações insanas 
 É só limpar 
 E ir ler algo que preste. 


 Sexo não cabe rima 
 Nem o pênis só na vagina 
 Cala a boca filho da puta 
 Que não sabe o que é literatura.. 




phOTOCALIGRAfIA





Mis Celânea Dois




 A dor de cabeça 
 Ponta de estrela aguda 
 Afiada fere a têmpora 
 Lágrima escorre da pálpebra 
 Punhal de prostaglandina 
 Lâmina tangente ameaça 
 A indefesa menina dos meus olhos.. 


 Corpo pulou no asfalto 
 Na frente do automóvel displicente 
 Por um segundo dormente 
 Ignorou o inerte transeunte 
 Potenciais suicidas 
 Perambulam nas calçadas da vida... 


 Peito 
 Lugar sem jeito 
 Leito sem curso 
 Onde não bebe o urso 
 Deixe que o peixe 
 Vá até a foz 
 Coitados de nós 
 Que não soubemos mergulhar 


 O namorado se envenenou 
 Na lavoura que era cárcere 
 Goles de pesticida 
 Mataram a morte adormecida 
 Esperança sem vida 
 De vida matança 
 Social estagnação 
 No Estado sem governança 


 Fraco 
 Torto 
 Linhas que descontinuam 
 Prosseguem a mal desenhar 
 Aquilo que seria revelação 
 Caso tivesse ideia 
 Caso houvesse emoção 
 Resistente 
 Retilínea 
 Um sentido para as mãos 
 Que terminavam em papéis 
 E não podiam cafunés.. 


 O vizinho eremita 
 Porcarias de mercado 
 Come de marmita 
 Mas a colher é de faqueiro 
 De prata do passado 
 Que brilhava o tempo inteiro 
 Quando era felizardo 
 Mas foi desprezando toda hora 
 Aquele que agora, 
 Tornou-se um bastardo... 


 Chuva fria 
 Ácida agonia 
 Mata verdes de semeadura 
 Falece a candura 
 De quem depende do tempo 
 Para alimento de esperança 
 Ver um novo sol 
 Que não inundasse poesia 
 Mas que trouxesse companhia.. 


 Em céu de cartolina 
 Nuvens de isopor 
 Vegetação de espuma 
 Guache furta-cor 
 Dando vida, 
 À porra nenhuma... 


 Tanto falou do amor 
 Do amor que não sentia 
 Que quando veio o dia 
 Não sabia o que era flor 



quinta-feira, 25 de junho de 2015

Crônica Cotidiana 23




Uma pequena ‘graaande’ ilha, perdida no ‘oceanno’ ‘immensurável’, ismo da capital. Nadei sobre o mármore escurecido, gannhei terra com os pés, bebbi letras pela boca. A ‘livvraria’. Porto ‘seghuro’ dos seres marinhos como eu, que não veem sentido na imensidão do mar se não houver uma ilha, mesmo que desconhecida, inacessível ou inimaginável. Deve haver uma ilha, pensemos todos assim, é melhor até para respirar. Precisamos de força, descanso, e novos tipos de água, líquidos, de substantivos ‘caetaneais’. Ah, um lugar à sombra. Fiz da poltrona uma rede, luminárias de sóis e dos meus óculos a ‘mentte’ em evolução. Estudantes circulavam ao redor afogados em "seus" ‘smartphones’, prendendo seus dedos na perpendicular atravessada dos cristais da obsolescência, desviando seus olhos da vida que passa despercebida e horizontalmente à sua frente boiando nas prateleiras, naufragando assim chances de aprendizado real: nova juventude, transviada por aquisição, pós-moderna que dói futuros. O livro, universo aberto que me expande na direção do infinito improvável. Tantas outras palavras, que eu me exagerei nas minhas consonantais. Poesias conduzindo-me à sensações indescritíveis, espaciais, cósmicas, ‘transcendental-ismo’. Um ato que vira sensação que traz emoção que enche os olhos de lágrimas suicidas no parapeito das minhas corajosas pálpebras. Seriam lágrimas aqualoucas? Depressivas ou infelizes de lascar mandioca? Nada disso...mundo imediatista que aborta verdades nas primeiras e não reflexivas impressões. E várias, e centenas de poesias desfilando naquele céu de gala da minha consciência. Saí do chão, flutuei, peguei carona num vento alísio e antes de chegar no Equador, pulei em Pernambuco. O Poeta tinha escrito sobre rever os arrecifes, que protegem belezas da existência nacional. Uma hora e meia, fiz-me tubarão devorando quase trezentas páginas de alimento, "sangue" por toda parte em todos os capítulos, guiei-me pelo aroma de um novo tempo. Tudo isso só para dizer que POETAS NÃO SÃO ESCRITORES: ELES SÃO AGRICULTORES DA ALMA...que sede de viver. Que sede de um Amor. Que sede de tomar goles e mais goles de vida numa boa viagem...