A
arquitetura impera, reina macedônica. Suicida todas as outras ciências, inexatas perto dela.
Belo, sim o êxtase sobre o belo palco de mármore. Reconhecimento tão obrigatório
quanto quitar o estacionamento. Quase uma era do gelo aos olhos. Cores circulam despojadas pelos corredores solenes. Vazios, tais corredores. Cosmopolita, o lugar parece um cateter
no corpo, abismo em plataforma, vácuo na atmosfera, buraco-negro no cosmo.
Entrar ali, é sair da cidade. Esqueça-se o conteúdo das lojas, deixe-se isso para
daqui a pouco e agora é pensar no espaço. Indescritível, exceção aos profissionais
do ramo das antigas pranchetas, os responsáveis e os não. O sujeito não oculto desta crônica simbolicamente curvou-se, é bonito mesmo. Detalhes transbordavam à percepção: distâncias "inteligentes" projetadas, para que os frequentadores não se encostem em outros transeuntes,
melhor vice-versa. Praça de alimentação deslocada, evitando agentes unicamente
restauradores de apetites, os sem poder aquisitivo, figurantes das passarelas. Luz,
muita. Local para quem pode, muito. Tanto pode que nem precisa vender, adquirir é outro negócio. Basta o
estabelecimento associado a alguma marca mundial. Massageia o ego, endireita o
bolso, coisas de status social. De vértice da pirâmide, vórtice relacional. João Carlos foi comprar
ingresso para show internacional em setembro. Deu uma voltinha, encontrou duas
moças comendo alguma coisa perigosa na rede fast-food
da minhoca temperada, o sanduíche mais barato do mundo no shopping mais oneroso da região: um tanto esquisito para não dizer bizarro. Deveriam ser atendentes, ou não, poderiam ser outras
transeuntes ser poder econômico, tampouco para refeições requintadamente elaboradas a la carte. João Carlos conhece o dono,
sabe do seu cacife. Salomão não o conhece, ignora o seu ‘despoder’. Um parabéns foi
colocado no meio do silêncio ensurdecedor do ambiente. Mas foi preciso
redirecionar o pensamento. Onde está Wally? O que fizeram dos consumidores dali? É
somente exposição, claro que não. Ele pensa se os clientes têm hora certa para
pousar seus cartões magnatas naquela Xanadu. Não adianta. João Carlos não está acostumado
a divagar sobre os eventuais problemas da elite financeira de sua Aldebarã. Todos
têm problemas, mas é estranho pensar que há gente cujo problema não é o
dinheiro. Que este não traz solução. Uma socialite esticada feito massa de
pastel desfilava suas nádegas siliconadas, uma quase Gretchen do Batel. No
estacionamento, ela saiu num Porsche. Ele, o sujeito do ingresso, voltou de Logan manual para a vida real.
Ela beirava os sessenta, olhou para ele de quarenta como se ela tivesse trinta, querendo coisas
de dezessete. O bólido automóvel excêntrico deu a ela mais crédito em seu tênue raciocínio, algo
que não o atingiu. Aquela big bunda pig prótese, certamente não peidava Chanel N 5.
Ele teve náuseas. Ele só conheceu o pedaço, jamais voltará ali. Não há identidade além
da simpatia pelo visual moderno, o qual já foi louvado em pensamento. Talvez a Livraria da Vila, quem
sabe, não obstante o paradoxo espacial do nome. Mas o mundo de verdade, é lá fora mesmo. Como é aguda a ponta da casta
social, ínfima perto da base popular. Como é distante o formato desta casta, contíguo ao espaço do povo. Lá no topo, um mezanino gourmet representava o controle social exercido por um meio de comunicação de massa, no topo eu disse. Que pena que o sectarismo também impera como a Arquitetura
privilegiada, clímax dos desenhos: é muita coisa para pouca gente, que nem se vê pela frente. Em analogia barata, o conteúdo do museu é diferente. Menos mal que desta vez, não
trouxeram um nome norte-americano, um sobrenome alemão ou um apelido popular.
Chamaram de Pátio, a obsolescência do comprar. E acrescentaram um time de futebol de Guarapuava, uma escola de samba da Antonina, um bairro aqui mesmo, ficou legal eu sei. Mas Wally não veio. Ingresso na mão, dúvida na cabeça: o show passará, a resposta é tão vazia quanto os corredores dali. E foi-se em boa hora a malévola bunda dentro do
Porsche com uma sacola très chic para contar alguma coisa a alguém que também não precise senti-la...
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