domingo, 27 de março de 2016

Contos do Livre-arbítrio

A vida. Este incessante transformar das coisas. E tudo são coisas. Seja material ou não, coisa é uma palavra empregada para designar sinteticamente qualquer outra coisa. Um objeto, um fato, um sentimento, até a ausência deste. E as coisas nascem a partir das transformações da natureza. Em curso, são modificadas pelo homem. O homem gera, cria, desenvolve, mantém e também acaba, encerra, mata. Tudo, todas as coisas. Assim é a humanidade, um acompanhar de mudanças ao longo do binômio tempo/espaço. O tempo e o espaço são instrumentos fornecidos ao homem para que ele escolha as suas coisas e o que fazer com elas, bem como o que não escolher, e ainda o que quiser deixar para trás depois de ter escolhido. Claro que isso envolve uma complexidade sem fim de circunstâncias, de quem são as pessoas e, principalmente, de seus valores. Nada de novo foi dito até agora. Todo mundo sabe disso; mas nem todo mundo tem consciência da realidade. Da verdade e também daquelas circunstâncias, o tal fenômeno humano. Dentre essas coisas mutantes, estão as relações humanas. As pessoas conduzem suas relações – de qualquer natureza – com indeterminado livre arbítrio. Indeterminado porque às vezes ele não é tão livre assim. Formar opiniões, juízos e estabelecer conclusões é algo demasiadamente sério, não obstante aqueles valores individuais. É muito difícil hoje em dia ter independência para se definir certezas sobre as coisas, quiçá as coisas alheias. Geralmente, há influência de terceiros, seja na política, na economia, no social, em qualquer campo recebemos informações que nos levam a formar nossas opiniões. O segredo, é o discernimento. Para filtrar, refletir e contextualizar o que a gente recebe como verdadeiro. Afastar o orgulho do desconhecimento, da fórmula equivocada para o cálculo, da distância, da ausência de diálogo, da passionalidade. Isto é, tendências que nos levam a algum lugar racional. Quase sempre, quando se chega lá, dispensa-se a emoção. Emoção, por sua vez remete a sentimento. Este, um dos valores em declínio na sociedade contemporânea, sobretudo quando se trata de afeto, muito por causa da transformação das coisas. E já que tudo se transforma, e o afeto é desvalorizado, um salve para – e este é o motivo desse texto – o presente. Sim, o momento presente: que seja aproveitado, valorizado, curtido, regozijado ao extremo, sem limites. Porque ninguém sabe o dia de amanhã. Muito menos se conseguiremos desenvolver e manter aquilo que geramos e criamos. De repente, a explosão. Uma transformação latente veio à tona e fez do ensolarado dia uma madrugada, nublada, sombria, morta. Depois da reflexão, perguntei a mim mesmo por que razão eu não aproveitei mais o presente, digo, aquele passado. Será que assim as coisas teriam se transformado de uma outra maneira? Para melhor, digamos? Não se sabe. O que se sabe é do livre arbítrio. Para escolher ou não, manter ou descartar. Nem importa se é livre. Nem importa se a razão superou o afeto. Uma madrugada longa pela frente. Fria, deserta, muda, árida, estéril. No fundo, nem tão inesperada assim. Mas quando a gente tem uma revelação oposta ao que era inestimável, faz sangrar. É tempo de contenção, fazer cicatrizar esta coisa. Ferida peculiar, essa em que a lâmina do juízo sentencia e condena sem contraditório nem defesa, pois já fez seu gume em punhal. Sim, o poder monetário e sua capacidade de corte social. Ó vida, bela chance que temos para desenvolver e emancipar espíritos, desprezada como se o mundo fosse apenas racional. Dá nada não, que prevaleça a liberdade. Livres para sentir o que quisermos, não obstante o vínculo afetivo. Vínculos, são coisas altamente passíveis de transformações: respeitemo-los...acatemo-las. Pois vínculos e transformações são coisas, frutos de escolhas. Sementes? Nem todas se desenvolvem como gostaríamos num tempo de cóleras, inversão de valores e superficialidades. Penso ter cumprido minha missão: foi apenas semear, o tropismo escapou das minhas mãos... 







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