Mais uma vez, o carro ia-se embora,
deixando você em algum ponto do caminho. Tive alguns avisos sobre a despedida,
mas de tão tenra minha adolescência, não havia gabarito para abstrair aquilo
como anunciações do fim. Na primeira vez, achei estranho, ali, naquela praia,
você ficar sozinho e nós termos que vir pra casa no planalto. Na segunda, após
o almoço na churrascaria do Darci (seu restaurante predileto), fiquei com a vó
e o vô na praça Rui Barbosa para pegarmos um táxi rumo a casa do tio. Antes de
descer, uma voz me disse em silêncio: “dê o último beijo em seu pai”. Cumpri, não em
obediência a ela, mas pela educação que vocês me deram. Dali algumas horas, a
notícia. Uma navalha etária no auge dos meus treze anos. Você partiu, na carona do
primeiro e único edema agudo pulmonar. Não tivemos tempo de quase nada. O que
você me ensinou, mais sei pelo DNA respeitado do que por conversas. São trinta
e oito anos sem você. O “se” não existe, não sou dado a especulações. Vou ao
cemitério de vez em quando, louvar a lembrança do que eu tenho sobre o
significado de família. Não tive sorte, nem prosperidade ou bens. Meu conteúdo
adquirido ao longo de toda essa sua infinita ausência, levarei comigo, aonde
for. É aquele tipo de coisas que tem valor imensurável. Não traí, não roubei,
não bati e nem enganei ou magoei alguém. Não deixei a ninguém o legado da
minha presença. Você sabe muito bem o que eu penso, o que eu sinto. E reconheço
que, de alguma forma, você me ajuda. As implicâncias de sua morte em minha
vida, são complexas demais para que eu discorra sobre elas. Basta, que eu pense
sem palavras, que as respostas vêm. Mesmo assim, tenho orgulho do que eu perdi
para a vida. Tenho orgulho de você, claro que não da perda, mas do que você representa ad eternum. Só levo comigo a indignação por alguns
filhos maltratarem seus pais presentes. Prometo que deixarei isso, um dia, à
beira do meu caminho, já que nada tenho a ver com isso. Fui um menino
diferente, um jovem normal e hoje sou um homem só, mas sem lamentos. Transformei as minhas dores em poesias, músicas e busca de paz pela natureza. Continuo, como ninguém, a ouvir vozes em silêncio; aprendi que elas são as mais importantes. Não importa de onde elas vêm. Sei da
minha missão, apesar de que também sei que não me adapto muito bem a este mundo, eu quis revolucioná-lo, não deu; não fui o único que não conseguiu isso. Estou ansioso pela sua bronca, quando a gente se reencontrar,
pois eu não li nem um milésimo do que você leu. Eu só soube escrever. Feliz dia
dos pais, paiê!
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