Hoje, ela me ligou na tarde. Fechei os
olhos, e foi como se eu visse uma árvore do passado, bela, frondosa, mas sem
frutos neste presente. Não soubemos regá-la adequadamente, tínhamos outras
coisas a fazer. Vivíamos assim, entre nossos compromissos e um pouco de
encontros. Fizemos deles, um tipo especial de catarse, avivando uma forma
diferente de companhia, o sexo era apenas uma importante justificativa. Abríamos os
corpos, mas calávamos as bocas. Um silêncio estranho tomava conta, parecia que
o presente da época era proibido, havia outras obrigações, para não dizer escolhas. Poderia ser de outro
jeito, mas não tivemos maestria para tanto, éramos inexperientes. Enquanto
ela foi atrás do grande amor de sua vida, eu fui à frente de todo e qualquer tipo de
relação minha. Ela conduziu certezas, eu carreguei dúvidas. Minhas dúvidas
foram a antessala da verdade, suas certezas foram o porão de um deslize. Separados,
cada qual em seu mundo, tivemos em comum a inabilidade em lidar cada qual com
seu relacionamento. Ela beirou a perfeição, eu sequer tangi aquilo que não me
apareceu. Não precisa ser perfeito para se amar alguém, mas a reciprocidade é
imaculável para a frutificação e manutenção do sentimento. Pouco sei dela, quase nada ela sabe
de mim. Porque até hoje, somos vítimas daquele silêncio pretérito, no qual fomos
nossos próprios algozes. A vida é assim mesmo, temos que compreendê-la do jeito
que for, é o nosso dever. Por mais que os descaminhos nos afastem de quem
significou um dia, a memória traz a imagem daquela árvore, cujas folhas ainda balançam
ao vento, que o orvalho da noite do futuro trouxe, agora, algumas lágrimas para se embalarem em minhas pálpebras. Mas é um tipo benéfico de choro, posto que não é lamento,
talvez seja uma forma de respeito, eu não sei direito. E de olhos embaçados eu
vi, o quanto eu já morri nesta vida. Abri os olhos, ela não estava aqui. Aonde
ela estiver, que ela possa ter muito verde em sua paisagem. Já que não dominamos
a natureza humana, que a natureza propriamente dita, preencha a tela de uma
realidade que apenas desenhamos, mas sequer fomos capazes de colorir. Quando eu,
contrariado, a deixava na esquina noturna de sua casa, acompanhava pelas
sombras durante minutos, até que ela chegasse ao portão. Antes disso, ela
desaparecia na paisagem. Sem imaginar, eu também partia, em direção contrária. Era um aviso, eu não sabia que já naquele tempo, sobrevivíamos
sob o condão do destino...
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