Romance.
Arte própria dos amantes. Na vida se fazem de infantaria. Levam o peito na
frente das coisas, o resto é secundário, supérfluo ou inclassificável. Mas não
há luta, nem casamatas, só tem frutas e pães de batatas. Quando muito, um leve
tropeçar que de imediato é reposicionado na vertical do caminho, ou na
horizontal de deitar, sempre com aquela m-a-r-a-v-i-l-h-o-s-a (segundo eles)
sensação da “volta”.
É
bonita a passagem dos amados. Alados, desfilam lado a lado, estão juntos na
noite, no fim de semana, em viagens, em programas só de mulheres & só de
homens, na foto de perfil e na da capa com os campos de flores nas redes sociais, sempre
unidos para todos verem e ninguém sentir.
(parênteses: sim, todos os outros
seres humanos - incluindo alguns animais de estimação - na face, na nuca e nas
costas de Terra estão proibidos de sentir qualquer tipo de atração, vontade, desejo,
ou mínima amizade sequer simpatia por algum dos pombos rasantes e vice-versa,
sendo estes, obrigados a sustentar até publicamente que seu amor é espontâneo, recíproco, fiel, não engorda e que é eterno porque durará!) – “durar”, é um verbo um tanto
interpretável, não? Voltando ao lado doce da coisa:
Sobretudo,
acreditam nas metáforas, que são as cócegas que vêm do coração, a massagem que
sofre o cérebro, pelos eriçados, mucosas lubrificadas, membros tesos, calores e hormônios dançando num êxtase fisiológico e por vezes invisível, só se percebe pelos
sentidos. Avivados, eles têm sensações divinas, passam a conceber a vida como
uma dádiva, um merecimento do universo platônico mas justo. A relação amorosa tanto basta,
que qualquer lugar é o paraíso. Simples, humilde, precário ou ostentoso, o
espaço é o que menos importa, o que interessa é o elo. O belo, o castelo, o
chinelo dele ao lado do dela, sob a janela do quarto que dura no tempo tanto quanto as receitas de panela.
Yes,
a fórmula do amor! Eureca, abracadabra e tantas outras interjeições estão no
currículo dos lovers, pessoas iluminadas que receberam o dom: a capacidade de
amar, então colocada em prática, não obstante a quais circunstâncias
pretéritas. Esqueçam o ontem, hoje já é o futuro. Suspiros, deleites, regozijos,
eles são um do outro et vice-versa.
Algumas
incursões registradas aqui, não são críticas nem pejorativas. Não desmereço
sentimentos, por mais alheios que sejam, nenhum deles. Penso que cada qual deve
sentir e louvar e defender o que sente, independentemente das opiniões de fora ou até
mesmo de perto. Minha insurgência, não é contra os que se amam de verdade, os recíprocos,
raros românticos por destino e natureza. É com todo o resto que se apresenta
livre para amar, mas não está, não veio, não ficará. Que traz junto suas
frustrações passadas e ligações atemporais, dependências de opiniões de terceiros para as novas
relações, ingerências afetivas. Toda essa falta de poder decisório, autonomia,
independência para dar ao seu sentimento, as asas que devia. É a grande
maioria. Pudesse, os alertaria, não admitem. Ao menos, uma reflexãozinha cairia bem.
Então
eu separo, e coloco os verdadeiros amados num plano acima, apartado, livre de
superveniências vis. Para que a sociedade não fosse obrigada a pensar que qualquer coisa é amor; não, não é!
Queria
que esta maioria, iludida, se libertasse, se emancipasse da ilusão do amor que não vivem,
apenas conduzem a esmo como se fosse veículo para tanto. Abrissem os olhos, as
mentes, em direção à uma verdadeira companhia, podendo esta até mesmo ser a própria
solidão. Encerrar a submissão, os costumes ocidentais, a tradição latina do
enlace, o clássico “ter alguém pra chamar de seu”. Que as relações jamais
fossem possessórias, mas sim livres. O amor, é essencialmente Livre.
Vi
isto no céu. Pouquíssimo no chão onde pisamos e somos. A minha tese sobre o
amor ideal - ou o amor verdadeiro ou ainda e simplesmente o Amor - é magnífica. Mas não é necessário patenteá-la ou defendê-la no CNPQ.
Beethoven era surdo. Sêneca era manco. Camões quase cego, Da Vinci disléxico,
Demóstenes gago. Eu, não amei...
- alguém passou por aqui e me disse
que eu era um mal amado, um cético, outro frustrado qualquer, que não respeita
e inveja os que se amam.
- respondi que esta pessoa estava completamente equivocada, justamente por não integrar a minoria dos que se amam em igualdade de
afeto. quem tem amor recíproco, não desdenha o desamor dos outros. pois para
mim, o amor é a única coisa que tem essência, embora eu não saiba qual seja...continuei:
- os perfumes? os perfumes vão-se
embora no vento...os valores? os valores sucumbem à chuva...a beleza? a beleza queima no fogo...a virtude? a virtude eu também
apenas imagino o que seja...seria a paz? a paz é com eles, aqueles poucos, juntos ou em solidão sobre a Terra...
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