LONGITUDE
Ele cruzou uma boa parte do seu
oceano. Desprezou os outros seis mares, não havia necessidade, era contrário à
busca. Deixou-se levar, no sentido das correntes, mesmo que não passivo. Exímio
observador, quando encontrava alguém sobre a linha d’água, não taxava com a
marca do encontro, do destino nem da fatalidade; poderia ser apenas um
trespasse de rotas, com ou sem plano de navegação. Afastava-se de tudo o que
não fosse profundo, misterioso, mas sem curiosidade alguma, apenas com muita atração
pelo mundo subjetivo. A intemperança, muitas eloquências, todo e qualquer espirrar
de egos sobre a superfície, nunca lhe foram aprazíveis. Desviava, contornava e
seguia seu rumo. Ele não sonhava com mergulhos abissais na imensidão sob seus
pés, somente imaginou se talvez existisse alguém que pensasse como ele, em relação a isso. Ou
seja, navegar pelo outro lado das coisas, do mundo, da vida. Fosse tecnologia,
seria algo como um sonar, fazendo varreduras sob o chão de água por onde
passasse(m). Umas vieram do florista, outras do bar e principalmente do nada,
que ele sentia-se uma quase Terezinha. Nem precisava dizer não, era tudo
possessório, satisfação de necessidades para não dizer carências, e descartável
como plástico. Material resistente à ação do tempo, demorava-se na memória, que aprendeu a reciclar. Enganou-se uma, duas, três ou quatro foram as suas
paixões, o resto era carne. Ele também foi carne para alguma gente. E o tal do
amor, não foi além de uma teoria sem começo. Quando via possibilidades, ondas
vinham de marés inesperadas, ele não olhava as tábuas. Se o fizesse, jamais
navegaria. Não teve medo de se envolver, abria coração e braços, abaixou as
calças, expôs o pensamento todo, geral e irrestrito. Levou carinho, trouxe
orgasmos. Deixou conforto, ganhou vazios. Ofereceu colo, teve indiferenças. Nunca pode chamar alguém de companhia.
Isto só é possível, por exemplo, quando alguém lhe ouve, sem você estar dizendo
qualquer coisa. Ou quando alguém lhe vê, sem você estar por perto. Uma espécie
de comunhão entre os sentidos, todos. Exato, uma teoria mesmo, que ele já se esgotou de tanto
revelar. Tese sem público, peça sem plateia, aula sem discente. Palavras sem
papel. Sua vida, era navegar. Lançava letras, em forma de frases que se afogavam
no mar. Para cada morte, uma estrela a menos no céu. A distância da costa já é
incalculável. Mesmo assim, a sensação de dever cumprido, realizada a missão
particular, em anonimato. Sob o céu, já tão escuro, que o sol já não confirma
visita amanhã...
Nenhum comentário:
Postar um comentário