terça-feira, 26 de setembro de 2017

Velho Coração












É aquele que aprendeu. Mas não as lições dos livros, dos manuais, nem das cartilhas supostamente amorosas. Nem dos terapeutas, dos gurus ou dos conselheiros de plantão. Aprendeu sozinho, sem ler nada, apenas vivendo ou deixando de viver as situações em que exigiram sua intervenção. O velho coração não obedeceu nada de ninguém. Seguiu os caminhos que sua vizinha consciência mandava. Independente e autônomo, ele é liberto de influências externas de toda natureza. É, pois foi assim a vida toda. Maturidade, é a principal característica. E foi assim que ele chegou a ela, à sua madura idade. Criou uma identidade com a vida, com a experimentação das coisas, indo pela boa conduta, tendo comportamento adequado, realizando serenas atitudes. Sem perfeição alguma, tampouco exemplaridade, apenas sendo fiel a si mesmo. Ele tem princípios, uma base para sustentar-se no meio do peito. Não são dele nem dos códigos, extraiu-lhes da vivência. Às vezes ponderou, umas até hesitou, mas conseguiu chegar aqui. Perdeu muito, ganhou quase nada, além de força e direção para seu afeto. De tão seu, ou original, fez-se errante. Diferente demais, consciente demais, a razão não o largou um só instante. Por isso, nunca se arrependeu. Teve como trunfo, o isolamento. Estranho, incomum, quase inconveniente o órgão. Voltou sua sensibilidade para as coisas da natureza, os dramas sociais e assim, sobrou-lhe indignação. Pacífico, jamais bateu em alguém senão com palavras. Poético, jamais atingiu alguém com palavras. Ou seja, valeu-se das palavras para compreender o sentido de tudo. Foram seu instrumento de bom combate. E a luta continua, mas ele já fez a sua parte. O velho coração hoje está de partida, da cidade. Aqui não há mais espaço para ele, nem tempo para suas palavras. Aqui, o sangue é mais escuro, menos oxigenado, quase venoso. É a vez do velho coração respirar ar puro. Não se envolverá com mais ninguém, não há mais o que sentir, saber ou aprender. Seu grau de desenvolvimento fechou suas portas e janelas, o sangue é caseiro e não convidará mais ninguém para entrar. É uma nova perspectiva, a solidão absoluta. Não há termo que se use para a abstenção de amor. De drogas, de sexo, existe. É que faz parte de um todo, chamado solidão. O velho coração, só quer mar e música. Outras palavras desenharão seu novo panorama, sua nova paisagem. Sim, novos porque ele jamais se considerará um coração velho. Este sim, o coração velho, foi dependente e submisso às paixões e amores errantes, tanto que envelheceu fraco, burro, senil e mal acompanhado, sempre no mesmo lugar. Ele, não. O velho coração está aí. Aqui e onde ele quiser. Não olhe para ele, sequer o procure ou dele queira saber. É tarde demais. Seu compasso, ninguém verá... 


MÚSICA INCIDENTAL - "Eu e Ela" - Vander Lee
"Os velhos corações, são acervos das melhores canções".




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