Na
Angels Flight, ela não desfilava na passarela, preferia ficar em pontos menos
estratégicos. Baixinha, biotipo de ninfeta, uma boca tão bonita que ficou na
história de quem ela conheceu. Seios fartos, para quem gosta. E o silêncio,
compatível com a idade de quem ainda tinha pouco tempo de vida noturna, aos
dezessete. Entreolharam-se, ele se aproximou para o início daquele era uma vez,
que prolongou-se no tempo, mesmo com pouco espaço. Dali, com mais um casal,
foram encerrar a madrugada no salão de festas vazio de um prédio qualquer. Ela
deixou telefone e um endereço no centro, morava em bairro distante. Na primeira
saída, na segunda semana e na terceira hora, o motel passou a ser a casa de
praia deles. E era bom. Muito bom. Era físico, era hormonal, era tribal, era
aquilo mesmo. Entregavam-se até mais que marido e mulher. A coisa tinha ares de
ritual: tiravam os sapatos, deitavam lânguidos na cama, sorrisos, trocavam
algumas novidades, uns beijos na boca impossível e ela ia para o banheiro.
Ficava uns vinte minutos lá dentro, voltava nua enrolada na toalha, ele a
esperava em riste, entre lençóis. Agarravam-se nas preliminares, sem perder
muito tempo. Do oral, demorado e único, partiam para o coito anal, ele adorava
regozijá-la assim. De costas para ele, ela se masturbava por baixo do ventre,
até o gozo profundo e libertador. Após um relax, era a vez de ele ejacular em
sua boca: ela voltava correndo para o banheiro, mistério que ele traz até hoje,
sem saber se ela engolia tudo ou passava no rosto, cuspir jamais. Repetiam a
dose. Até que ela, em determinada época, revelou-se noiva. Foram alguns anos
assim, apesar de que, em função disso, diminuíram a frequência de um encontro a
cada dois meses, para a cada quatro meses. E depois para duas vezes por ano. Até
que um dia, praticando o que ela mais gostava, de pé dentro da hidro, ela
desmaiou. Passado o susto, eles meio que se desentenderam e ficaram uns três
anos sem se verem. Mas ele tinha aquele endereço no centro, foi até lá, era
casa de uma amiga dela. Esta, fez-se de elo e os dois proibidos voltaram a se
encontrar. Quando ela casou, afastaram-se de vez. Passou mais um bom tempo e
encontraram-se num circo, cada qual com sua família, filhos pequeninos. Ela saiu
para levar o filhote ao banheiro, cruzou por ele num instante mágico, de emoção
e mudez. Nunca mais se viram, até a separação temporária dela, quando o procurou. Foi
até a casa dele, conversaram e fizeram sexo. Perguntaram-se, porque que motivo
nunca haviam namorado. Não acharam respostas, além do compromisso dela. Um, o
melhor parceiro sexual do outro. Hoje, ambos têm muito mais diálogo, pela
experiência, pelas vidas que passaram. Não são felizes, nem ela casada nem ele
só. Mas o fato de outrora terem abdicado de uma vida a dois, tem peso
significante. Um peso que não faz cessar a dúvida: pode o amor nascer do sexo? Na
sequência, os filhotes dessa dúvida: existem casais que se mantém apenas por
sexo? Existem casais que se mantém apenas por amor? Existem casais que se mantém
com amor e sexo? Existe tudo. A fauna relacional é extensa, inimaginável seu
fim. Assim como o caso do sujeito e a noiva, sabe-se que um dia começou. Dele,
ela guardou imagens do passado. Dela, ficou na lembrança a boca mais gostosa
que beijara. Não tentaram ser felizes. Ocuparam-se, somente do prazer. Um descompromisso
mais que verbal. Não há culpa. Nem telefonemas, sequer mensagens. O que restou,
foi a certeza de que o tempo, faz de
cada encontro uma chance. Nós, todos nós, é que não sabemos o que fazer com
nossas chances...
- Oi. Vamos hoje?
- Thum!
*Thum: uma resposta feito bordão que ela usava
para perguntas desencontradas...
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