sábado, 6 de fevereiro de 2016

Contos do Mariscão






Santa Celinha e o Carnaval 
Ele nunca se deu bem com o carnaval. Carnaval enquanto festa de foliões. O tal brincar, o dito samba, as sempre marchinhas, o salão, a avenida, a mulher explorada por toda a madrugada chamando a atenção, época de consumo ao cúmulo. Ele deu outras concepções ao intervalo. Festa não, feriadão. Folia não, descanso. Brincadeiras não, oportunidades. Samba não, fandango. Marchinhas não, fuscão preto. Bailes nada, praia. Avenida coisa nenhuma, mar. Mulher nua...vez em quando, não era obrigatório, só quando desse certo mas não precisava dar certo para que depois se pudesse considerar um bom carnaval. Sem saber das bactérias e outros tantos microrganismos que veio estudar depois, era preventivo bem antes. Temporada de relaxamento ao máximo, era o que entendia. E o tempo foi passando...e o carnaval se lapidando. Não como pedra rara, mas feito escultura em bronze, guardada sempre no jardim dos fundos da casa. A infância com os pais na praia; adolesceu em casa; juventude acampando sem maconha na Ilha. Já com a então família, viagens ao interior. Hoje sozinho, no interior de si mesmo. Mas aquele verão de 83 foi memorável. Calouro de Direito, ele queria outro curso que não conseguia passar. Compraram barraca grande, foram para a Ilha do Mel os três amigos mais um irmão de um deles. Muito sol, cachaça e banhos de mar. Até que na noite principal, no Forró do Mariscão, ele a encontrou. Celinha era demasiadamente bela. Uma paulistinha mignon, cabelos castanho-claros, pele de cetim sobre corpo de boneca. Entreolharam-se por algum tempo, e veio a abordagem mútua, se é que isso existe, melhor chamar de encontro. Beijos, corpos e um por do sol tão único com uma alvorada que ninguém testemunhará igual na história. Ela era virgem, ele respeitou, fizeram quase de tudo. Dez anos mais velha, voltou para Santa Bárbara D’Oeste, queria morar em Manaus. Encontraram-se mais uns dois carnavais no mesmo lugar. Despediram-se, para sempre. Sem dor, tinham muito o que fazer ainda na vida, para assumirem relação. Fã de Elis, ela cantava MPB ao ouvido dele sem violão que pudesse acompanhar, a barraca tinha 40 quilos de ferros e panos. Tão simples, porém foi o seu melhor carnaval. Um excelente mar, uma ótima praia, uma boa parada, e uma agradabilíssima companhia como toque final. Ele continuou frequentando. Criou sua juventude ali naquela praia, ali na areia. Onde semeou seus sonhos, desenhou seus valores, escolheu seus caminhos: foi assim que o rapaz virou homem. E é justamente no litoral que encerrará o seu ciclo de vida, levando o futuro de volta ao começo. Vagou...vagou...e vagou por aí, sem encontros, somente alguns esbarrões. Talvez Celinha, tivesse a tal reciprocidade que ele nunca viu. E também nunca mais soube dela, vice-versa. É preciso respeitar o destino, ele não tem hora p’ra chegar, tampouco ir embora. A vida vinha dali, de trás do Farol das Conchas. Pena, mas aquele momento ou amanhecer foi a prova de que a felicidade, muito mais do que figuradamente, vem em forma de pinacoteca: dura o tempo em que nos dispomos a contemplar... 




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