Não odeio ninguém, mas quase. São os
amantes do frio, estes deslocados índios urbanos que fazem a dança da geada, chamando para
si todo o encolhimento do mundo. Recaindo sobre nós, os solares, os praianos, os
nudistas (naturistas para os pudicos). Em seus ritos, louvam a cor do sol, o branco nas gramas, os tons dos
edredons, dos cachecóis, ceroulas, meiões, aquecedores a óleo, cafés, vinhos, fondues, sopas e tantos outros consomês, tudo o
que possa disfarçar sua frialdade interior, congênita ou adquirida. Pergunto o
que nós outros temos a ver com tais aberrações genéticas. Vontade de colocar
toda essa gente antártida num balão e soltá-los feito padre matinhense até pegarem carona na corrente de um vento predominante de oeste e se
perderem nos arredores de alguma calota polar. Meu único crime, deportação
compulsória. Conviver com eles, é a maior prova de alteridade de um ser
humanamente normal. Eles que não gostam de sol, de pouca roupa, de sorriso
aberto, água gelada, cerveja, mar também. Não gostam de calor, blusa decotada, pele,
sensualidade, beijo de língua, cunilingus, sexo. É gente que só da bitoquinha ou selinho, copula em um minuto, relações precoces, gozos
imediatos e olhe lá, porque quase sempre estão invaginados, retraídos, murchos, encapsulados e secos em todos os sentidos, sem falar no sono e nas dores de cabeça. Melhor: não olhe, porque tudo está encoberto,
apenas imagine-se penetrando algum órgão, se você errar e entrar numa bolsa de
água quente, problema seu. Um texto boçal, não posso ter veia humorística dilatada com
três graus centígrados e sensação térmica de menos cinco. Seres ectópicos,
descoloridos, 'apinguinzados', bem que poderiam vazar para desfilarem seus hipotálamos insensíveis e
indiferentes sob as barbas das focas e das orcas, os equatorianos agradeceriam sua emigração sem volta e sem dó algum. Mas se a passagem não der, vão todos tomar o quê e aonde
quiserem lá em São Joaquim ou em Urubici! Longe de mim, fora daqui! Sinceramente, é só nessa hora em que eu penso que sou muito ingênuo, por não conseguir admitir que a vasoconstrição generalizada possa permitir acontecer em pleno país tropical aquela coisa tão caliente chamada felicidade ...
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