quarta-feira, 8 de junho de 2016

Contos Além Manicômios




No teclado, já cansado, três letras estão fracas. Aplico força digital sobre elas, para resistirem e fazerem valer a sua vida artificial, ou seja, modestas incursões na vida real dos meus poucos leitores, gente rarefeita. Sou um aprendiz ou residente de terapeuta das minhas ideias, colocadas em papel de cristal líquido. Ao lado, como num hospital de campanha vietnamita, leitos onde se encontram pensamentos, opiniões, rebeldias e muita indignação, principalmente com a coisa quase parada da vida e das pessoas de sangue frio. Se Lobsang foi o médico, eu sou o cão de Lhasa, um lobo para não ficar tão society assim. Um lobo matreiro, que observa as pessoas ao longe e com educação, só para criar textos. Trago as belas e as gordas, as feias e as magras, as jovens e as velhas, as pobres e as ricas, as medianas, todas as mulheres que couberem no meu imaginário surreal, lá para dentro do ambiente, fora da guerra urbana. Raros são os homens, não pelo machismo, mas pela simples questão de afinidade, eles ainda cabem em pouquíssimos sentidos, outros. Até porque o universo feminino é infinitamente mais estelar que o yang. Claro, apenas aquelas mulheres que me despertam interesse em dizer sobre algo que delas interpreto, pois é delas que algo emana, e às vezes não, nada emana. Elas não sabem que escrevo, isto é, que as levo para a cama, que por sua vez, são os leitos daquele ambulatório meu. Lá, fazemos de tudo. Do impossível ao iminente. Do proibido ao liberado. E tudo sem conotação sexual. Até já amei uma vez. Sem toque, sem perfume, sem cafuné, sem juras. Era uma grande mulher, que se fez minúscula perante meu tamanho sentimento. Depois de algum tempo, eu teria dado alta para ela. Não sem transformá-la na pessoa mais feliz do mundo. Do meu mundo. Nosso mundo. O mundo ao redor daquela coisa que eu chamo de hospital, que combina mais com um sanatório e, na verdade, é apenas a minha consciência, um cantinho de paz na cidade oculta. Mas a vigilância sanitária fechou tudo. Fui embora com a minha loucura para a praia. Ainda não cheguei lá. Lá, onde só terei redes, pois não trarei ninguém à minha vida, minha baila criativa. Onde eu possa me preocupar apenas com o mar e as suas tábuas de marés. E lá, onde escrever seja nada mais do que um simples ato de descrição das paisagens. Porque eu sou dado à algumas máximas, como naquela em que Nietzsche diz “há sempre alguma loucura no amor; mas há sempre um pouco de razão na loucura”. Então, racional é dar muita vitamina D para essa minha insanidade toda. Pois sei que amor de primavera, não desce a serra... 


Ah, como é bom não ser o único neste mundo.. 

"Balada do Louco" - Rita & Roberto
by Melody 101



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