No teclado, já cansado, três letras
estão fracas. Aplico força digital sobre elas, para resistirem e fazerem valer a sua
vida artificial, ou seja, modestas incursões na vida real dos meus poucos
leitores, gente rarefeita. Sou um aprendiz ou residente de terapeuta das minhas
ideias, colocadas em papel de cristal líquido. Ao lado, como num hospital de
campanha vietnamita, leitos onde se encontram pensamentos, opiniões, rebeldias
e muita indignação, principalmente com a coisa quase parada da vida e das
pessoas de sangue frio. Se Lobsang foi o médico, eu sou o cão de Lhasa, um lobo
para não ficar tão society assim. Um lobo matreiro, que observa as pessoas ao
longe e com educação, só para criar textos. Trago as belas e as gordas, as
feias e as magras, as jovens e as velhas, as pobres e as ricas, as medianas, todas as mulheres que
couberem no meu imaginário surreal, lá para dentro do ambiente, fora da guerra urbana. Raros são os homens, não pelo machismo, mas
pela simples questão de afinidade, eles ainda cabem em pouquíssimos sentidos, outros. Até porque o universo feminino é infinitamente mais estelar que o yang. Claro, apenas aquelas mulheres que me despertam
interesse em dizer sobre algo que delas interpreto, pois é delas que algo emana, e às vezes
não, nada emana. Elas não sabem que escrevo, isto é, que as levo para a cama, que por sua
vez, são os leitos daquele ambulatório meu. Lá, fazemos de tudo. Do impossível
ao iminente. Do proibido ao liberado. E tudo sem conotação sexual. Até já amei
uma vez. Sem toque, sem perfume, sem cafuné, sem juras. Era uma grande mulher,
que se fez minúscula perante meu tamanho sentimento. Depois de algum tempo, eu
teria dado alta para ela. Não sem transformá-la na pessoa mais feliz do mundo. Do
meu mundo. Nosso mundo. O mundo ao redor daquela coisa que eu chamo de hospital, que combina
mais com um sanatório e, na verdade, é apenas a minha consciência, um cantinho de paz na cidade oculta. Mas a vigilância
sanitária fechou tudo. Fui embora com a minha loucura para a praia. Ainda não
cheguei lá. Lá, onde só terei redes, pois não trarei ninguém à minha vida, minha baila criativa. Onde
eu possa me preocupar apenas com o mar e as suas tábuas de marés. E lá, onde escrever seja nada
mais do que um simples ato de descrição das paisagens. Porque eu sou dado à
algumas máximas, como naquela em que Nietzsche diz “há sempre alguma loucura no
amor; mas há sempre um pouco de razão na loucura”. Então, racional é dar muita
vitamina D para essa minha insanidade toda. Pois sei que amor de primavera, não desce a serra...
Ah, como é bom não ser o único neste mundo..
"Balada do Louco" - Rita & Roberto
by Melody 101
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