Estuário Paradigma
Estandartes e tantas cores. Corpos
seminus desfilando suas taras. Marchinhas para manter bêbados em pé. Um salão
para confetes, serpentinas e vômitos, uma pista, rua-avenida, alameda, qualquer
plano, qualquer piso. E a sempre fuga do presente. Quando ela não ganha
adereços do tempo, diz-se fora-de-épóca. Todo dia é dia de fugir do tempo. Todo
tempo é tempo para fugir do cotidiano. A festa de fevereiro justifica e
autoriza tais disparadas, as quais se dão em direção ao nada. Hoje, três meses
depois da diáspora oficial, ainda vemos gente fugindo de suas realidades. Deslocam-se
para a periferia de suas vidas, escolhendo um cantinho para pensar melhor sobre
elas. Melhor assim, do que se tornar mais um dependente químico aguardando
internação compulsória. Um texto acéfalo, agregando carnaval, alcoolismo e existências,
todos fora de hora. No fundo, ele quer falar de medo. Quem tem medo, ou se
encolhe ou foge. Aos encolhidos, meus sentimentos. Aos retirantes, um salve. Pois
a fuga sã, não é fuga, é libertação. Libertar-se de suas próprias amarras. Uma capital
cheia de cordas, esse é o nosso habitat. Onde passamos o resto do ano sem
festas, sem cores, sem nudez nem libido. Sem tolices musicais, sem chão para
prostramos. Sem justificativas que amenizassem nossos medos. Medo, é a morosa necessidade
de ação frente alguma coisa importante. Miscelânea, mas é assim mesmo que
funciona a sobrevida. Paula foi para o litoral tentar resolver seus dilemas, a
natureza era soberana a tudo, precisava restaurar contacto com ela. Lá, os
problemas ficavam menores, mais baixos, mais magros e passíveis de soluções.
Eis que ela levou Alvarinho a tiracolo no pensamento. Não sabia mais o que
fazer com ele. Ele aliviava seus desejos, trazia o gozo lá do centro de sua
cidade-estado. Até que um dia o clímax passou a ser artificioso, perdeu
sentido, razão de ser, sobrou a carne e mais nada. Como na imagem de duas peças
de boi sobrepostas na vitrine do açougue. Ela queria algo mais que uma troca de
secreções. Começou a entender que ela era objeto do deleite dele, por mais
carícias que ele fizesse, amigo que se dissesse, parceiro a quem recorresse, seu amante extra-oficial. Uma
espécie de contrato sinalagmático, gerando obrigações e deveres para ambas as
partes: “dê-me, que te tomo também”. Tola, depois do amor mecânico mandava o
malandro travestido de companhia para outro quarto, e ficava sozinha em sua cama relaxando, revisitando sua
memória, aportando em seu futuro, não sem deixar de criar um vácuo no presente, expoente de solidão.
Não mesmo, chega de rotina. Sexo, não é só pênis e vagina. Deve haver outro
caminho que conduza ao prazer. Um caminho onde o medo não passe de uma fantasia colorida.
Deve haver outros prazeres! Sim, um prazer legítimo, de brilho definido, num outro
nível de vínculo! Eureca, a viagem e o Santo Graal. Basta de ser Paula. Alvarinho nem imaginava que a partir daquele exílio, teria de se converter a Onan. Ela voltou de lá, disposta a
ser uma nova pessoa. Antes, faziam dela apenas mais uma mulher...uma mulher a mais...uma mulher qualquer...faziam.
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