Se eu não fosse quem eu sou. Eu não
seria assim, obviamente. Mas o que não se clareia, é como eu seria. Essa
impossibilidade, ficção que nem paralela é de tão fora do plano real, afasta
compulsoriamente as especulações, os devaneios, o absurdo de imaginar ser o que
não se é. Feito exceção, me permito elucubrar – por um instante – para ver até
onde eu iria. Primeiro, preciso de um apoio verdadeiro como exemplo de
condução, instrumento para chegar até algum lugar longe do possível: você. Pronto, já não sou mais eu. Rompi vínculo com
a vida presente, lancei-me em pensamento vestido nas asas da imaginação. Sim,
eu lhe desejaria. Vi em você algumas coisas que me aproximariam,
caso eu não fosse eu. Mas como hipoteticamente já não sou, esqueço isso. Seus
gostos, nossa identidade; sua simplicidade, nossa calmaria. A música do mundo e
a nossa poesia. Morreram a distância e os anos. Eles já não são empecilho,
posso lhe desejar. Se nosso encontro se transformará em amor, não é necessário
saber, há disposição em somar, sem se preocupar no que vai dar. Um abraço, tantos
beijos, e o sexo. E tudo isso de novo,
em meio a muita conversa, passeios, comidas e aventuras. Sorrisos e lágrimas,
gestos e sonhos e sensações. Um emaranhado de formas de convivência que
seguiria livre como uma fita no céu. Mas no céu há o vento. A ausência da chuva. E eu não pude
brotar em mim, a companhia. É o fim do texto, do poema, do imaginário, eu
voltei. Menos de duas dezenas de linhas, durou meu delírio. Isso, explica minha
cordilheira de pedras junto ao mar. Não estou aquém delas, eu sou as próprias minerais em sentido nato, muito mais que figurado. Isso é para que você sinta,
que eu não vim a este mundo para amar, tampouco para ser amado. Por isso, a
fita corre terrena entre meus dedos, meu céu é vazio. Não sinto fogo além das minhas
palavras, áridas por chuva que jamais virá. Em meu ofício de viver, não compus os
quatro elementos básicos da felicidade, sobrevivo apenas um: a escrita, a terra. E é nestas frases que eu deixo-lhe uma cor de certeza, afirmando que há em você o que não nasceu em mim: o potencial para amar. Longe da lógica de mercado, das livrarias e dos espectadores, resto em meu
canto criando a minha solidão. Esta, a minha conhecida, colega, amiga,
namorada, esposa, amante e desconhecida, tudo ao mesmo tempo. A ela devo
favores, posto que é companhia. Mas o compromisso, não é com ela, é comigo
mesmo. Prefiro o silêncio da solidão, do que do que o calar de quem algum dia
já foi voz para mim. Olho para o céu, vi rastros de que estive por lá. É porque
voltei rapidamente, antes da lágrima que demorou-se no azul à espreita da utopia de um
amor inexistente: aquele que não mora em mim...
Ribbon In The Sky - Stevie Wonder
original tape
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