Diametralmente oposta a qualquer ordenamento jurídico, DESUNIÃO ESTÁVEL é uma imaginária relação multiafetiva ousada entre a Poesia e a Música. Como esses valores estão em declínio nos dias pós-modernos, decidi promover impulsos de acasalamento sentimental entre ambas, com a substancialidade e a emoção que brota dessas duas formas de expressividade dos sujeitos na sociedade civil, ou seja, nascentes da natureza humana. Aos amantes, as cortesias da Casa.
quinta-feira, 31 de dezembro de 2015
quarta-feira, 30 de dezembro de 2015
Chovendo no Ensaio
Contos
Todos fúteis porque não conduzem
As pessoas frágeis que se deixam
levar...
Poesias
Canoas que se lançam às águas
Todas importantes por resistirem
Às correntezas que pretendem
afundar..
E como chamar o mar
Com essa voz de cidade
Grãos de areia na garganta
Que na verdade são poeira
Pois as ondas não chegam
A banhar-me o corpo
Mudo,
De sobreviver a seco...
O pior dos silêncios
É o que emudece a palavra escrita
É feito o silêncio da morte
Ou o fim da voz na vida..
Sinto falta da areia nos pés
Água nas mãos, sal na pele
Ondas nos olhos,
Brisa nos pulmões
Escutar o quebra-mar
Mas não me lembro do gosto de
ninguém..
Como é difícil limpar o sangue do
chão
Enquanto as lágrimas,
São removidas facilmente da face
Não gravei os sorrisos
Eles se foram nas mãos do vento..
Palavras doces
Neste mundo amargo
O que seria sobremesa
É prato principal..
Viajas
Apenas para fugires de ti
E encontrar-te noutro lugar..
Da madeira que era árvore
Fiz portão
Que o tempo empenou
Imagine o que ele faz com a gente
Tão frágil desde a semente...
Palhaços comparam amores
Evitando se comparar a si mesmos,
No curso do tempo..
Fizessem isso
Não estariam na plateia da vida..
Alguém tem sonhos sujos?
Ou todos os sonhos são lindos?
Se são,
Como são os desejos limpos,
Antes de serem sonhados?
De onde vem um sonho,
Se o nada não pode ser limpo
Nem sujo, nem belo ou lindo..
Noções de engenharia, por favor...
Chora o dia
Lava a natureza
Sobra questão
Por que razão
A chuva não leva
O que não quero em mim..
Ouço a chuva
Algo está sendo dito
Vejo o que não se mostra
Está atrás do céu
Atrás dos meus sentidos
E eu não sei chover
Pra chegar na frente das coisas...
Sem colo
Deito na tarde muda
E o som da chuva
É a música do coração
O vento abraça
Não é frio
É o contrário
Porque é abraço..
Chuva não tem ritmo
Faz compasso
Porque molha o coração
Acerta o passo
Acompanhando o bordão
Sem esperar pelo sol final
Só morre aquela chuva
Que empurrou aquele coração..
Dentro do armário da cozinha
Tudo era par
Xícaras, copos, pratos
Lá fora, uma vida ímpar
Cá dentro,
A sua resistência...
Espaço duplo entre as poesias
Respeito aqui
As distâncias que não consigo lá fora..
A não adaptação ao mundo exterior
Encaixa-te cada vez mais dentro de ti.
terça-feira, 29 de dezembro de 2015
Coias do Brasil
A esperança é
uma criança que mora em nosso porão
E o sábio, lá do ático,
vai transformando-a em perspectiva.
juventudes sempre soltas no jardim,
aguardando adultos, chamarem da sacada...
"Caçador de Mim" / Magrão & Sá
- 14 Bis
segunda-feira, 28 de dezembro de 2015
FICÇÃO Empírica
Se eu não fosse quem eu sou. Eu não
seria assim, obviamente. Mas o que não se clareia, é como eu seria. Essa
impossibilidade, ficção que nem paralela é de tão fora do plano real, afasta
compulsoriamente as especulações, os devaneios, o absurdo de imaginar ser o que
não se é. Feito exceção, me permito elucubrar – por um instante – para ver até
onde eu iria. Primeiro, preciso de um apoio verdadeiro como exemplo de
condução, instrumento para chegar até algum lugar longe do possível: você. Pronto, já não sou mais eu. Rompi vínculo com
a vida presente, lancei-me em pensamento vestido nas asas da imaginação. Sim,
eu lhe desejaria. Vi em você algumas coisas que me aproximariam,
caso eu não fosse eu. Mas como hipoteticamente já não sou, esqueço isso. Seus
gostos, nossa identidade; sua simplicidade, nossa calmaria. A música do mundo e
a nossa poesia. Morreram a distância e os anos. Eles já não são empecilho,
posso lhe desejar. Se nosso encontro se transformará em amor, não é necessário
saber, há disposição em somar, sem se preocupar no que vai dar. Um abraço, tantos
beijos, e o sexo. E tudo isso de novo,
em meio a muita conversa, passeios, comidas e aventuras. Sorrisos e lágrimas,
gestos e sonhos e sensações. Um emaranhado de formas de convivência que
seguiria livre como uma fita no céu. Mas no céu há o vento. A ausência da chuva. E eu não pude
brotar em mim, a companhia. É o fim do texto, do poema, do imaginário, eu
voltei. Menos de duas dezenas de linhas, durou meu delírio. Isso, explica minha
cordilheira de pedras junto ao mar. Não estou aquém delas, eu sou as próprias minerais em sentido nato, muito mais que figurado. Isso é para que você sinta,
que eu não vim a este mundo para amar, tampouco para ser amado. Por isso, a
fita corre terrena entre meus dedos, meu céu é vazio. Não sinto fogo além das minhas
palavras, áridas por chuva que jamais virá. Em meu ofício de viver, não compus os
quatro elementos básicos da felicidade, sobrevivo apenas um: a escrita, a terra. E é nestas frases que eu deixo-lhe uma cor de certeza, afirmando que há em você o que não nasceu em mim: o potencial para amar. Longe da lógica de mercado, das livrarias e dos espectadores, resto em meu
canto criando a minha solidão. Esta, a minha conhecida, colega, amiga,
namorada, esposa, amante e desconhecida, tudo ao mesmo tempo. A ela devo
favores, posto que é companhia. Mas o compromisso, não é com ela, é comigo
mesmo. Prefiro o silêncio da solidão, do que do que o calar de quem algum dia
já foi voz para mim. Olho para o céu, vi rastros de que estive por lá. É porque
voltei rapidamente, antes da lágrima que demorou-se no azul à espreita da utopia de um
amor inexistente: aquele que não mora em mim...
Ribbon In The Sky - Stevie Wonder
original tape
domingo, 27 de dezembro de 2015
Contos Depois da História
A Última Brincadeira
Em fim. Trinta e cinco anos se
passaram desde os quinze. Tantas mudanças, transformações, caminhos, mas tem
algo que continuou sempre do mesmo jeito. Mudava o próximo, não o modo de estar
da coisa. Tanto que nem sei a diferença entre uma relação e um relacionamento,
no estranho mundo da afetividade. Talvez eu tenha tido apenas relações, os
relacionamentos são envolveres mais profundos, desses que as novelas e os
filmes abriram mão, ainda constam nos livros. Relações, deveras estáticas;
relacionamentos, dinâmicos, movimento. Não tive este prazer, tudo se evanescia,
uma gangorra de oscilações em que nada se definia, encaminhava ou apaziguava. A
surpresa, o espanto, surgidos em imediato desprazer frente a situações
cotidianas, as tais condutas, comportamentos e atitudes delas. Pensamentos e
valores não tardavam em vir à tona, sempre opostos aos meus. Até já me disseram
que eu espero algo feito eucaristia, dó, perdão, caridade, esses negócios que as
religiões inventaram para agregar sustentabilidade. Como se eu tivesse crença,
seguisse dogmas, e vivesse de fé. Outras, me disseram que sem amor eu nada
seria, teve até música cantando isso, doutrina. Também, aquelas que me rotularam
como um ser sexual ao extremo. Lamentaram meu insucesso, não fiz fortuna nem
fui celebridade, alegaram. Umas justificaram assim, outras foram embora pelo
vento do silêncio. No reino das indiferenças, fui desgarrado habitante, também
indo embora antes, durante e depois dos fins. Um saldo cômico de conclusão:
ninguém me conheceu ao certo. Porque mais do que sorrir, mais do que dar prazer,
eu só queria paz. Mas paz, é aquilo que se adquire quando se está livre. A
liberdade, por sua vez, só se tem quando se está leve. Infelizmente, as belas
mulheres que cruzaram meu caminho, trouxeram muita carga do seu passado. Não
houve chance, não tivemos tempo, não se formou espaço. Todas, sem exceção, me
interpretaram mal. Quando a gente está ao lado de alguém que nos concebe erradamente,
não há mais o que fazer: já estamos do lado de fora da vida dessa pessoa.
Gargalhar seria exagero, mas eu movimento meus lábios neste sentido. Descobri
que a religião, é a diáspora das uniões. E que os valores, são as trilhas no deserto
de cada um. A tal reciprocidade, eu jamais saberei o que significa. Hoje bem
sei o que faltava aprender na minha última brincadeira: o amor, é uma diversão
feita de plástico...
sábado, 26 de dezembro de 2015
quinta-feira, 24 de dezembro de 2015
terça-feira, 22 de dezembro de 2015
BAR, doce BAR
-Olhe para o céu: está vendo as
cinzas?
-Não...não há nada lá!
-Há sim, mas você não está vendo. São
as cinzas do Amor.
-Você é louco?
-Não. É que as cinzas do Amor, são azuis.
-Nenhuma cinza tem outra cor, que não
cinza.
-As do amor são azuis. Por isso existe
o vento, para levá-las para longe de nós.
-Então como saber se já se foram?
-Não é preciso sabermos: por isso elas são
azuis. Também porque são cinzas, nada mais adianta.
-Confuso...
-O fim da chama no coração, é o
princípio das cinzas no céu...
-E o que são as estrelas então?
-São o lustroso brilho no chão do céu, já limpo pelo vento do dia...
segunda-feira, 21 de dezembro de 2015
sábado, 19 de dezembro de 2015
sexta-feira, 18 de dezembro de 2015
Via NO Crucis
nunca escutei os sinos
passei distante das catedrais
abominei ritos, símbolos e doutrinas
capelas, templos me repeliram
evitei fiéis..
pois eu sempre me vi independente
solidário,
deixei deus do lado de fora de mim,
a se ocupar com os outros,
os necessitados dele
vim só e a pé
aqui estou
não há mais nada à minha volta
sequer a sensação de alguma presença
qualquer presença
nenhuma sensação
e nenhum daqueles necessitados
pra me contar como foi a ajuda
porque eu só queria saber
se eu já ajudei alguém um dia
mesmo que tenha sido alguém
que também não ficou dentro de mim...
mesmo que tenha sido alguém
que também não ficou dentro de mim...
quarta-feira, 16 de dezembro de 2015
Crônica Cotidiana 28
Combo
Uma rede
multinacional de lanches rápidos, menos poderosa, quase figurante no ramo da
pseudoalimentação. Águias comem ratos, aculturação e velocidade na praça daqui.
No estabelecimento, pessoas que acreditam estarem ingerindo natureza no
quadrante do almoço que nem hora mais é. Mas dá tempo de engolir combinações,
mesmo sem a mastigação devida, afinal é assim com tudo na vida. Aguardei a
infante servir-se, enquanto ‘roubava’ tudo ao redor de nossa mesa limpa por
mim: personagens, genuínas, levei-as para a casa do meu pensamento. Essas moças, pobres moças, ah se soubessem o que eu escrevo. A primeira, em luta evidente contra sua silhueta
arredondada, mordendo saladas num momento libertário de dieta social imposta
pelos padronizados modelos do devir. Mais uns vinte quilos a menos, e ela estaria na pista
sem instrumentos de pouso para aproximação do homem macho, objeto de desejo de
quase toda relação possessória e vice-versa. Depois daquela mesa, um grupo de ex-estudantes
modernizava-se deslizando impressões digitais em seus telemóveis, hoje parte
integrante do corpo, extensão fundamental para seres de pequeno alcance. Trocavam risadas entre incursões tão descartáveis quanto o
papel higiênico que faltava no banheiro: o conteúdo não era marrom, ele
simplesmente não tinha cor, mas eles não saberiam disso, talvez jamais. Noutra mesa,
a mãe e a filha pequena de colégio. Onde estaria o pai? Haveria um pai na
história delas? Ou teria morrido, talvez fugido, quiçá sido sucumbido pela
libido? A filha olhava a comida, a mãe observava atenta pela janela uma árvore lá fora, quem sabe se perguntando onde estaria a natureza de viver naquela cidade.
Quando a minha terminou, alcançou-me quase metade do seu sanduíche, embrulhei e
fui dar um destino diferente àquele desperdício. Um guardador de carros com um
colete reluzente de listras horizontais cor de limão, estava de costas para a
via, apoiado num portão arrumando o pé de sua muleta. Pedi licença e lhe
perguntei se aceitava parte de um almoço. O que para alguém é resto, sobra,
excesso, para alguns é tudo. Baixo, manco, uma pele que parecia outra árvore no
tempo. Sem intervalo para me olhar nos olhos, estendeu a mão e pegou a oferta, foi
logo levando à boca depois de um agradecimento em sussurro. Saí dali segurando
lágrimas de revolta contra os poderes da República: eles não precisam da vida
do cuidador, somente de seu voto. Seria melhor se ele fosse um robô, que
assumisse os deveres da pessoa humana, e esta viesse a inexistir. Um robô, não
precisaria dos dentes que aquele homem perdeu da boca, hoje mastigando como um bagre ribeirinho qualquer. Comentei com minha pequena sobre o mundo. Espero que ela tenha aprendido
duas lições: o desperdício versus a fome, e o encabulamento versus a
solidariedade. Ela percebeu que ele não sorria. Mas eu não contei que era assim
durante todo o dia e em todos os dias. Enquanto o maltrapilho se arrastava para entre aspas cuidar
dos automóveis, togados muito longe dali comemoravam mais um auxílio, desta vez
o moradia. Não havia cães perto da loja. O cão dessa história, é o próprio mundo de uma
pessoa...
Trabalho INterno
Que amor!
Que
lindos aqueles dois!
Casal perfeito.
Um pro outro e este pra mais ninguém.
Veja
como andam lado a lado, se encaixam.
Repare como se entreolham, se amam.
Tão parecidos,
quase irmãos ou primos.
Fofos, gatos, gudes.
Exemplo, modelo, receita para a
felicidade conjugal.
Enfim, a perfeição em forma de dois.
A vida é mesmo bela.
Nem
precisa perguntar por que, como ou até quando...
terça-feira, 15 de dezembro de 2015
P A S T (I N) T E N S E
Olho para
trás
Mas já
lavei os lençóis
Não há
marcas
O que havia,
era um jeito de dobradura
Mais
nada...
Meu pequeno
ontem
Era grande
quando era
Pequeno é
hoje
Tão,
Que não se
mede
Falo no
sentido cortês
Uma
metáfora para toda aquela brevidade...
Mala vazia
Nas costas
do meu tempo
Não adianta
parar no espaço
Não há o
que tirar de dentro...
Certo
alívio, me causa
Ter deixado
o passado por terra
Penso nos
coitados
Que não
fizeram isso
Ainda se
arrastam pelo seu futuro
De tão
vazio é o seu presente...
Sim,
Trago
histórias
Sem
protagonismo algum
Enredos
‘noir’..
Intimista,
Esqueci-me
de ver a vida lá fora...
Não há
flores no jardim
Eu afastava
sementes
Enquanto o
sol insistia..
Repare
Já não há
mais fogo
E por ter
sido amor
As cinzas
são azuis
Só para não
serem vistas
Dispersando-se
no céu que não contemplamos..
A leveza do
homem
Que se
liberta do seu tempo ido
É
diretamente proporcional,
Ao peso do
seu hoje,
Ou seja,
Do vácuo
presente..
As
hortênsias na casa da vó..
Eu não
sabia seu nome
Mas ficava
horas olhando..
Hoje eu sei
como se chamam
Mas sequer
me permito
Colocá-las
em minha imaginação
As mulheres
fora de minha casa..
Faço do que
se foi
Feito
caixas de ossos em capela
Aglutinação,
Organização
de espaço
Não para
que chegue mais
Apenas para
não trazer poeira...
Fotos,
Que bela consideração
tenho por elas
São minhas
janelas
Na casa hipotecada
de um tempo
Em que eu
não tinha cortinas...
Há um
grande cemitério, por onde passei
À frente,
Desvio das
maternidades
Não é
preciso que morra mais alguém para mim
A natureza
se encarrega daquele lugar..
Quatro cães
na minha história
Blau,
Sissi,
Kong e Buba
Todos criados
por um lobo
Sem garras
pra viver na selva
Sem sonhos
pra morrer na relva
Em minha estepe,
Não fui
capaz de matilha...
Vendo a
imagem, meu peito se enche de não sei quê. Um menino loiro, bonitinho, na
ingenuidade dos seus três poucos anos a colocar talvez pela vez primeira, o pé na
rua. Mal sabia o que a vida lhe reservava, os caminhos que cruzaria. Uma infância
cheia de estórias, mistérios, heróis e personagens, seria o prefácio de uma
vida cheia de histórias, verdades, ausências e solidão. Viver, é transformar a
infância em algo real. Tenho pena dos que, como eu, conseguiram fazer isso...
segunda-feira, 14 de dezembro de 2015
DISCOVERY
"Quiet" - John Mayer
REALIDADE
CIENTÍFICA
O Túnel. E
eu não sabia que ele era convergente. Um funil que se estreita ao longo do
tempo, com a boca da vida voltada para frente ou para baixo, uma ampulheta sem reverso, grãos
de areia representando as pessoas que conheci. Um só sentido, a luz final. No
caminho, os grãos vão ficando para trás ou para cima, alguns caem do beiral que
fica logo às costas dos meus dias. Meu passado é pequeno demais, não permanece
no recipiente existencial, deixo quase tudo pelo sinuoso trajeto de mim. Hoje
me perguntei se eu faria diferente, caso soubesse que era assim. De pronto,
respondi que não, pois nem foi preciso refletir um pouco. De nada adiantaria
mudar conduta contra o destino pré-concebido, sem adivinhações. Reparava sim,
mas não com a atenção necessária que pudesse me fazer concluir que meus dias
seriam cada vez menos demográficos, escassez relacional. Em poucas
oportunidades, aconteceu como se eu fosse um punhado de café e então a água
quente enchia o filtro, fazendo-me iludir que era gente chegando para ficar. Águas
passam tal como a chuva que cai ao longe e não molha, não germina, não floresce
por aqui. E após algumas décadas, reconheço a confluência do vitral. As paredes
são transparentes, sempre vejo o mundo lá fora, mas sem lamentar o meu devir
aqui dentro, aqui dentro de mim e ao meu redor. Muita tese para pouca
disponibilidade. Muita teoria para quase nenhuma identidade, doutrina extra para
afinidade zero. À minha maneira, esta foi a minha passagem por mim. Vi tantas
coisas lindas, ao largo. Tanta beleza, distante. Mas, eu vi. Ninguém me contou
que havia. Eu não me limitei aos que escreveram sobre isso, eu fui lá e quase senti. Organismo preso na
matéria, disparei meu nômade espírito pelos mais diversos confins do
pensamento, pelos mais recônditos becos da imaginação, pelas fossas mais virginais da minha consciência, pelos menos explorados rincões
do meu coração. A plataforma era rasa, o talude também, a planície e o final nas Marianas:
eu, mergulhei. Talvez por isso, tenha restado sozinho, ninguém veio junto, nem comigo. A modernidade é mesmo tardia, preocupa-se somente com o nível das linhas d’água. E
de tão oposto ao superficialismo, ao imediatismo e ao obsoleto, eu ascendi
vertiginosamente em queda livre em direção ao oco do meu mundo. Meus braços
fortes, sustentam as paredes do túnel. Com as pernas, vou andando sem parar
para hesitar. Parece que ao aproximar-me dali, quanto mais eu sinto a resistência do meu corpo, mais
estou saindo dele, a abandoná-lo como se eu tivesse um exoesqueleto. Sábia natureza,
há quase ninguém perto de mim, hoje. Mas era o único Túnel que eu tinha para seguir. Nele, reconheci que aquele quase sentir, já me bastou como felicidade...
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