domingo, 17 de dezembro de 2017

Um Salto na Natureza



A montanha não é dos homens. A montanha é a cidade dos animais. Cheio de vazios em sua selva, o homem se lança a desafiar a montanha, como se fosse possível. Então ele invade o território que não é seu, dizendo que é pela natureza, mas na verdade é tão somente um desafio. Uma necessidade espacial, de ocupar algo alheio sem ser crime, uma compensação àqueles vazios predominantes onde mora, cuja artificialidade esfria o ambiente. Falando em ambiente, na cidade da montanha ele é selvagem, na selva do homem há selvageria. Duas coisas distintas semanticamente parecidas, mas de significados desiguais, em função das realidades dos lugares. A palavra quase certa, é desafio: um eufemismo para o que chamamos de fuga. Este, atinge proporções dimensionais, envolvendo as dificuldades encontradas na montanha para cruzá-la, e também os obstáculos existentes no homem para superá-los. Ele começa, e na primeira hora o coração acelera, o corpo vai se habituando à intentada. Depois da aclimatação, o silêncio toma conta, parecendo que os donos da casa e os rios vão sugerindo que o invasor se cale, dentro da mata e diante de si mesmo. Começam as reflexões, as buscas das respostas para problemas que aparentemente estão ali, mas que remetem à selva humana. A perda de água e sais minerais é absurda, reposta a cada novo rio com o qual se depara. A musculatura fica tensa, a mochila parece aumentar de peso, fazendo lembrar o quanto de supérfluo carregamos pela vida. Vontade de deixar algumas coisas por ali, mas a consciência ecológica impede, como também impede isso na selva humana, nem para todos. Há um objetivo, na caminhada que seria de duas horas e meia, foi de três. Paradas para normalizar o coração, poupar o restante do organismo, mais água. O caminho, é na verdade um carreiro onde só passa um, mato denso e fechado, onde o sol não chega, mas abafa feito forno. Subida, que ao final dá em quatrocentos metros de altura. Ali, centenas de cobras ocupam naturalmente seu lugar, passamos por boa parte delas, o cansaço e a determinação de cumprir a meta não permite vê-las. A morte ronda a floresta, representada a cada risco corrido num escorregão, num tropeço, numa queda, num corte, uma fratura, uma parada cardio-respiratória pelo excesso constante de esforço, o estômago se rebela. Enfim, após o último lance em aclive de 70º, chega-se ao salto. Descritível, a maravilha. Mas, como dizia a musica caipira, “o cansaço me dominou” e tal descrição caberá melhor em outra oportunidade. Uma hora e meia de relaxamento na monstruosa cachoeira, com quatro piscinas construídas pela rainha do espaço, a natureza. Aquilo não é do homem. É dos peixes, das cobras, dos insetos, dos pequenos e grandes animais que se banham e bebem naquela água gelada e pura. É dos macacos. Quando o homem assume desafio desse porte, não tem volta. Não tem ajuda, é momento de solidão. Mais do que tudo, o controle mental é quem rege os passos, entre pensamentos, sentimentos e degraus para mais de metro, lama, troncos, pedras e conclusões. O aprendizado da trilha vai longe. No sentido de sua dimensão. Sempre com suporte em força desconhecida. Quando o homem supera seus limites, vai reconhecendo essa nova força até então oculta. Força que eu não sei o nome, tão nova que eu ainda nem a imagino passando por aqui em minha selva, principal ambiente para meus outros desafios, aqueles sem eufemismo.. 


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