A
CHEGADA
Eu
não acreditava em sonhos. Até que me vi dirigindo numa estrada deserta, rumo ao
interior. Uma planície, pradaria esverdeada, vegetação densa ao nível do
chão. De repente, do alto de uma colina, o veículo suspendeu no ar como um
Boeing vazio em decolagem, me elevando a dezenas de metros de altura. Uma visão espetacular
encobriu o susto, pois homens não voam, ao menos de dentro de suas máquinas
terrestres. Mas era sonho e no sonho tudo pode, qualquer ternura, assim como
beijos na boca da mulher proibida. O verde tornou-se maior, mais escuro, mais intenso, mais verde. Eu, voando sobre o chão, rota de minha vida. Não se via pessoas, animais,
casas, construções, quaisquer sinais de civilização. Apenas a natureza
dominante do ambiente, extensão sem fim. Eu não olhava para o céu - me sentia elemento dele - apenas para baixo. Mas eu
estava subindo, já fora do carro que se desfez num instante que nem sei. Flutuei
como nunca. Bem mais do que um mergulho no rio, que na vista do topo da
montanha, que boiar em mar de almirante, que o rolar de dunas altas. Sensação única,
quase não existencial. De tantas interpretações, somente uma é válida, assim
como na vida, em relação aos fatos e sua verdade. O que extrair disso, é dúvida
que nasceu junto deste meu amanhecer. Talvez sinal de que meu mundo anda mesmo deserto.
Que eu preciso ascender em algum sentido. Ou então que os sentidos já não fazem
mais sentido e a hora é essa, meu tempo se foi. Se morrer é assim, tão bonito para quem se vai, talvez eu
deixe por aqui as lágrimas, todas. Não ficaria de bom alvitre, lá de cima molhar em vão ou atingir ninguém aqui embaixo. Apesar de que os prantos só fazem sentido se ocorridos em
reservado. Mas isso é por aqui, na Terra. Eu, no sonho, já não estava mais
aqui. Uma outra dimensão foi anunciada, onde tudo é muito diferente,
prevalência de tantos contrários. Lágrimas? Lá, já percebi que seria muito
banal chovê-las apenas sobre árvores tão bonitas...
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