EMENTHAIS
A lâmina afiada do punhal do
destino, corta silenciosamente as madrugadas em fragmentos. O faz abortando
sonos, esta maneira nada sutil de despertar, obrigando a olhar para as estrelas
e assim tentar antecipar alguns passos do futuro. Como que preparando alguém
que há de presenciar a próxima alvorada, não importando se ela vem de sol ou
não. Aqueles pedaços são sempre pares, embora assimétricos. Explica-se então o
distanciamento das relações tentadas, cuja incompletude não permite amanhecer
sonhos, desejos ou vontades queridos no ato de deitar-se com as reflexões.
Simbolismo ao extremo, quase nada fica sem razão de ser. O problema é o cansaço
de ver se repetindo vidas em fatias, cuja precisão do corte impede nova junção.
Mas para que reunir coisas velhas, senão para depositá-las no baú da história.
Eis a chave do grande mistério, transformar em memória aquilo que já se perdeu.
Importa saber que a chave não é do baú, o qual deve permanecer fechado em
respeito ao que já se foi; ela é do ato, filho da conduta com o comportamento.
Enquanto uns vivem a lamentar tais perdas, outros limpam e amolam a superfície
dos seus punhais. Tanto que, hoje, levo comigo a sina de uma pedra de afiar,
deixada sempre ao alcance, para todo e qualquer momento iminente ao escorrer de
uma lágrima em condolência. Ergo o braço para o alto, e num figurado golpe certeiro
separo o passado, sem qualquer imediatismo tosco dos professores morais avessos
aos sangramentos. É que não devemos suportar o peso de relacionamentos sem
presente, perspectivas ou coisas da natureza temporal. Toda carga será
castigada, para que possamos seguir livres na fluidez de nossa
insustentabilidade...
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