Quarta-feira, sem cinzas, não
brinquei o carnaval. Cai uma chuva forte, no início da noite campeã, alguém
ganhou algo em algum lugar. Longe daqui. Aqui, onde acaba a luz, breu total. Preguiça
de acender as velas, sei onde estão, mas não quero. Prefiro assim. Há tempos
não presencio tal ausência, generalizada. Há carga no computador. Reabro o
blog fechado desde dezembro, 2017. Devo ter algo a dizer. Tem algo em mim. Algo
que está incomodado, descontente com tal clausura. Não adiantaram algumas
poesias feito catarse, esse algo é alguém. Alguém de quem nada sei, praticamente
nunca ouvi, limitei-me aos contatos virtuais e a tal superficialidade inerente
a eles. Mas não é um alguém qualquer. Infelizmente – ou não – minha
sensibilidade, minha percepção sensorial, ainda está viva, ativa. E assim que
eu percebi, trouxe-a comigo no ano que passou. Tempo em que não escrevo nada,
apenas alguns apontamentos sobre ela. E nada profundo. Por respeito e por todos
os outros fatores que regem o movimento das gentes nas sociedades. Foi então que resolvi
mergulhar mais fundo. Por que ela? Ainda não sei, hei de vasculhar o mundo sob
a linha d’água. E sei, que é um mundo só meu. Ela não pertence, digo, sua
realidade não acontece por aqui. Mas tem um pedaço dela ao meu redor. Uma parte
indeterminada, vinda da contemplação às suas imagens que tive acesso. E confesso,
despenquei. Do alto dos costões das minhas nulidades, impossibilidades, negativas e certezas
que construí para mim nesses últimos anos. Era um alto de escolhas, de
afastamento, de recolhimento social e principalmente afetivo. A opção pela
solidão é para poucos, para os fortes. Mas é justamente essa opção, que acabou fazendo o contrário, o avesso da vida. Totalmente oposto a qualquer tipo de
relacionamento, foi que eu me conectei a ela. Lutei, mas não consegui. Porque eu
estava certo: ela é fonte. Quando se caminha num deserto relacional, uma fonte
verdadeira não se despreza. Mesmo, em território alheio. Assim, eu a
compreendi. Concebi como fonte, sem invadir propriedade, sem ofender ou sugerir,
sequer revelar a já necessidade de manifestar por vontade, tomar um copo d’água.
Se há culpa, é toda minha. Portanto, é meu papel conviver com esta sede. E se o
copo não está ao alcance, meu papel a partir de hoje é transformar minha sede
por ela em outra coisa, que nem sei se vou conseguir. Só porque é muito
difícil, deparar-se neste terço da vida, com uma pessoa que transmite tudo
aquilo que não vi até hoje. Uma espécie de identidade. Uma ideia de diálogo. Um
tipo de desejo. Uma variante de carinho. Como a superficialidade das poesias
não adiantou, venho para este canto, tentar sua alquimia. Educado e com
garantia de ser compreendido em função do caráter poético/lírico da coisa,
ganhei liberdade. Não chegarei às minhas profundezas, mas revelarei todas as
cores dos arrecifes que vejo em seu mar. E tentarei desenhar aquele algo que
sinto, quando a vejo passeando pela sua praia. Sua beleza não é minha. Mas eu
fico com sua arte. E regozijo..
Falling Slowly
Glen Hansard & Lisa Hannigan
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