quarta-feira, 6 de março de 2019

Cor de Rozza



Quarta-feira, sem cinzas, não brinquei o carnaval. Cai uma chuva forte, no início da noite campeã, alguém ganhou algo em algum lugar. Longe daqui. Aqui, onde acaba a luz, breu total. Preguiça de acender as velas, sei onde estão, mas não quero. Prefiro assim. Há tempos não presencio tal ausência, generalizada. Há carga no computador. Reabro o blog fechado desde dezembro, 2017. Devo ter algo a dizer. Tem algo em mim. Algo que está incomodado, descontente com tal clausura. Não adiantaram algumas poesias feito catarse, esse algo é alguém. Alguém de quem nada sei, praticamente nunca ouvi, limitei-me aos contatos virtuais e a tal superficialidade inerente a eles. Mas não é um alguém qualquer. Infelizmente – ou não – minha sensibilidade, minha percepção sensorial, ainda está viva, ativa. E assim que eu percebi, trouxe-a comigo no ano que passou. Tempo em que não escrevo nada, apenas alguns apontamentos sobre ela. E nada profundo. Por respeito e por todos os outros fatores que regem o movimento das gentes nas sociedades. Foi então que resolvi mergulhar mais fundo. Por que ela? Ainda não sei, hei de vasculhar o mundo sob a linha d’água. E sei, que é um mundo só meu. Ela não pertence, digo, sua realidade não acontece por aqui. Mas tem um pedaço dela ao meu redor. Uma parte indeterminada, vinda da contemplação às suas imagens que tive acesso. E confesso, despenquei. Do alto dos costões das minhas nulidades, impossibilidades, negativas e certezas que construí para mim nesses últimos anos. Era um alto de escolhas, de afastamento, de recolhimento social e principalmente afetivo. A opção pela solidão é para poucos, para os fortes. Mas é justamente essa opção, que acabou fazendo o contrário, o avesso da vida. Totalmente oposto a qualquer tipo de relacionamento, foi que eu me conectei a ela. Lutei, mas não consegui. Porque eu estava certo: ela é fonte. Quando se caminha num deserto relacional, uma fonte verdadeira não se despreza. Mesmo, em território alheio. Assim, eu a compreendi. Concebi como fonte, sem invadir propriedade, sem ofender ou sugerir, sequer revelar a já necessidade de manifestar por vontade, tomar um copo d’água. Se há culpa, é toda minha. Portanto, é meu papel conviver com esta sede. E se o copo não está ao alcance, meu papel a partir de hoje é transformar minha sede por ela em outra coisa, que nem sei se vou conseguir. Só porque é muito difícil, deparar-se neste terço da vida, com uma pessoa que transmite tudo aquilo que não vi até hoje. Uma espécie de identidade. Uma ideia de diálogo. Um tipo de desejo. Uma variante de carinho. Como a superficialidade das poesias não adiantou, venho para este canto, tentar sua alquimia. Educado e com garantia de ser compreendido em função do caráter poético/lírico da coisa, ganhei liberdade. Não chegarei às minhas profundezas, mas revelarei todas as cores dos arrecifes que vejo em seu mar. E tentarei desenhar aquele algo que sinto, quando a vejo passeando pela sua praia. Sua beleza não é minha. Mas eu fico com sua arte. E regozijo.. 



Falling Slowly
Glen Hansard & Lisa Hannigan



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