quinta-feira, 21 de março de 2019

A Estorinha de Um Amigo Meu



Sempre fui ouvidor. Jamais me neguei ao aconselhamento. Mesmo sem saber por que procuravam a mim, e não (a)os terapeutas. Mas desta vez, foi algo original.

Ele não me contou a história dele, parece que não havia. Dele com ela. Coisas do mundo virtual, tendem a ser desfeitas pelo seu caráter evanescente, geralmente é o vento que se encarrega disso.

O que havia, então? Disse ele que era algo parecido com magia. Uma ligação unilateral, na qual ele tentou ao máximo evitar, sabedor dos poréns. Nem sabe como começou. Quando viu, era quase tarde da noite. Do dia, do vespertino, do tempo.

Trocaram poucas palavras. E o escambo se transformou num vai e vem de imagens e frases, dela para ele e dele para ela, pela ordem, e principalmente na contramão, no versa. Falou que não recebia suas fotos como se elas estivessem sendo mandadas para ele, não era pretensioso o sujeito. Quando apareciam, ele se juntava aos destinatários e a sua modesta admiração.

Combinaram poesia como intuito da coisa. Literatura amadora, inspirações e tais, era o que bastava para a troca.  Ela compromissada, anunciava-se livre. Ele livre, dizia-se descompromissado. Diferenças.

Mas a vida, tão simples que é, quando trata das formas da beleza, traz o seu grau de complexidade. Nenhuma beleza verdadeira é simples, é fácil, é passível de isenção, de autonomia, independência. Quando se se entrega a ela, quando é reverenciada, mesmo que em contemplação, algo sedimenta, em algum lugar. Polens, e a irresponsabilidade dos ventos.

Existe algo do lado de lá. Algo que veio parar dentro dele. Não, não é amor. Também não é desejo. Mais se parece com emoção. Uma sensação contida, que se lança na grande circulação do organismo no instante em que ele se depara com as imagens dela.

Isso não está nos livros, nos consultórios nem nos escritórios da vida, não é ciência. Tampouco empirismo, posto que não é voluntário. Sabe-se lá o que é.

Derradeiro, ele me disse que na última imagem que ela lhe enviou, algumas lágrimas vieram à tona. Imediatamente, ele as recolheu com o movimento das pálpebras.

Pois ele não faz jus a qualquer nível de sentimento. Fosse medo, não haveria lágrimas. fosse covarde, não haveria frases.

Não fossem as diferenças, haveria poesia. Do mais alto grau de profundidade e reconhecimento.

Não precisei aconselhá-lo. Ele mesmo compreendeu que, mais do que fases, a vida é uma sucessão de limites.

E ele foi embora para casa, com a consciência de que aquela mulher, dentre muitas a mais bela, tem natureza linear.

Navegar, seria preciso não fosse proibido.

Bastou-lhe a certeza da existência da Rozza, sem encontrá-la.

E restou-lhe a areia, onde plantamos palavras que as ondas-pálpebras levarão.

Por isso a mudança. Por isso o Pontal.

E o horizonte à vista. Dos olhos, ele aprendeu...



     Linha do Horizonte - Azymuth




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