sábado, 29 de julho de 2017

CLIP - KARONA modificado


A música mais bonita do cancioneiro brasileiro
"Viagem"
Paulo César Pinheiro & João de Aquino


versão 1 - Emílio Santiago (por Cris Caldas)


A lágrima que vem da música, passa pelos olhos, corre pelo rosto, e cai no papel:

Todos os dias. Ela vem ao meu encontro, sim. Lá na frente da casa, não precisa campainha. Passam pessoas, automóveis e aviões, ninguém para. Não há ninguém que tocou, que toque ou tocará, tocaria, ninguém. Tímida, e por isso mesmo, por assim ser, ela vem me visitar. Amiga, mulher, namorada, amante, irmã, a poesia pode ser tudo, o que ela quiser. Não a defino, só sei que é algo feminino que ronda ao meu redor. E entra em minha casa, meu pensamento, meu coração. Ela me ocupa, me preenche, dá sentido aos espaços vazios que habitam em mim. Talvez ela seja a religião que eu não sigo, a deusa que eu não tenho, a fé que eu desacredito, o sentimento que eu não amo. Não fosse ela, eu seria deserto. De emoções, de razões, de sensações. Ela chega, senta-se ao meu lado, dá-me seu colo, seu abrigo, conforto e todas as palavras que eu posso conjugar. Assim, eu posso ser mar. E podemos viajar em ondas, tons e cores de sensibilidade. Minha única rima, de todos os meus anos, ela é companhia. Ouvidora e conselheira, usa a linguagem da música para que eu compreenda melhor essa coisa apelidada de vida, mas que se chama solidão. Parabéns, poesia. Porque todo dia é seu aniversário...

...e por ser assim, trago o bis do parabéns:


versão 2 - Fabiana Cozza




CURTA - metr.




terça-feira, 25 de julho de 2017

Qualquer Lado Para Cima - poesia em descompasso




Eu tenho três pães
É muito,
    pouco,
Ou muito pouco
Quantos comem três pães
Para um é muito
Para três,
    ou para seis
Quem são vocês
Que distribuem os pães?
São poucos
Muito poucos
Quem dera fossem nada
E a farinha,
    totalizada...


Um berro
Para depois o silêncio
Alguém pede atenção
Pela voz em grito,
    ou pelo mistério do depois?
E quando não tem brado
Não há mistério
É sempre falta
Latência
Carência
Dois ou mais quês de expiação..


Esqueça, logo
Pois há sonhos que não se realizarão
Sem necessidade de se esperar o amanhã
Para que se tenha ciência disso...


Abro a porta, o que tenho?
Eu tenho uvas, rubis... com vírgula
Também mimosas, mexericas, bergamota, ponkâs, tangerina, monte negrinho ou outro sinônimo..
Não tenho colo
Nem bocas, mãos, braços, pernas, coxas, seios, bundas, órgãos sexuais...
Essa janta de sexta à noite vai ser um tédio
Muita fruta para nenhuma gente
O quê é ácido afinal?
As minhas ausências ou aquilo que eu tenho?


Eu vi
No beiral de tua sacada
Tinha uma muda de não sei quê
Broto que não deu
Se desse, lá eu estava
Sem chuva nem ventania
Mas em pessoa,
    que tanto lhe quis alçar
    qualquer flor
    em qualquer andar..


Pausa para o chá
De tarde, o café
Quem é que não quer
Disfarçar sua frialdade
    que não assume
    não reconhece
Só se aquece
Via fogo artificial
De natural
Apenas os outros...


Em sua mãos,
    as terminações nervosas livres
No coração,
    as metades afetivas hesitantes
E lá na consciência,
    O princípio hermético da razão
Ser qual ser,
    eis a pergunta
Qualquer um,
    mas apenas um,
Eis a melhor resposta,
    depois do depende.. 


Elas vão embora da gente
Levam os cafés,
    os chás e as cervejas
    o vinho e a aguardente
Ficamos com as xícaras,
    as xícaras e os copos
    as taças, os cálices
Todos guardados
Porque a solidão é um gargalo...


Depois do tapa
Qualquer palavra é soco


A mulher também caça
O homem finge que não
Hipócrita, ele finge ser presa
Esconde seus dentes e as mãos
Depois da luta
A mulher chora
O homem lamenta
E os dois sangram
Disfarçam que não
Mas todo mundo vê
Porque vermelho,
    é a cor mais verde...



PHoto RESENHA





domingo, 23 de julho de 2017

DESClassificados



Procura-se uma companheira: 

- que não goste de shopping 
- que frequente muito pouco os salões de beleza 
- que não use maquiagem 
- que não seja constipada 
- que sofra os mínimos efeitos na TPM 
- que não seja hipocondríaca 
- que não seja fumante 
- que não seja alcoólatra 
- que não seja dependente de smartphone 
- que pratique diálogo 
- que não faça greve de conversa 
- que não faça academia 
- que tenha mãos e pés razoavelmente bonitos 
- que não tenha silicone 
- que não seja obesa 
- que não se submeta às ordens de sua mãe 
- que não sucumba aos caprichos de seus filhinhos 
- que não seja dependente de opinião alheia 
- que não seja enraizada em seu passado 
- que tenha qualquer atividade laboral 
- que goste de música boa 
- que leia bons livros 
- que não seja de direita 
- que seja indiferente a pets 
- que goste de tomar sol 
- que adore viajar 
- que ame praia 
- que goste de cozinha alternativa 
- que ande nua dentro de casa 
- que curta sexo não conservador 
- que não tenha limites para gozar 
- que tenha sono pesado 
- que não tenha ciúme 
- que aceite um companheiro não ciumento 
- que use vestidos 
- que permita carinho 
- que goste de fazer e receber cafuné 
- que esteja realmente só 
- e que... / continua a cada requisito lembrado e trazido à baila em data vindoura. 
- ... não use cabelo preso 


Oferece-se em troca: nada. 
Na verdade, é somente à título de informação.  
Não há qualquer pretensão de relacionamento. 
"Procura-se", só para saber se existe alguém assim... 


quinta-feira, 20 de julho de 2017

Contos Descaminhos



Eu faço o meu café. Na manhã gelada deste inverno cruento. Não tenho fome, tenho frio. Lembro-me dela. Distante, como uma onda em alto mar. Mas ainda aquém do horizonte. Não enxergamos bem, temos que nos valer de outras sensações para compensar a baixa acuidade visual. Sem ver, pode-se pensar. Pensar, que não se confunde com o sentimento. Este, é espontâneo; aquele, é provocado. O café quente deslizando pela garganta calada, provoca o pensamento na direção dela. Ou então, é o caloroso pensar nela que se mistura com o café na direção da minha essência. Dúvida que eu não preciso ter, pois nada muda. Nada muda uma relação calada, surda, morta de sensações abortadas. Depois de que o café aquece, ou que o pensamento conforta, ou chega o barco, vem o vazio. Um espaço imenso, estrada deserta. Quem construiu? Fui eu ou foi ela que fugiu? Há muros ou cercas neste espaço, como se fossem acostamentos ou paisagens? De que é feito o chão dele? Onde fica o quilômetro zero? Poderíamos ter partido ou aquilo era um caminho próprio apenas para libertar minha ilusão? Minha criatividade, é isso. A semente em mim não era de amor, era de libertação imaginativa. Então eu criei. Inventei admiração, devoção, fanatismo até. E todas aquelas sensações que eu tive, não passaram de suporte artificial para tanta coisa que veio naturalmente a partir da beleza singular daquela mulher. E que se perdeu. Perdeu-se no meio. No meio do caminho que não existiu. No espaço vazio. Sim, eu aprendi. Que depois dali não haveria mais lugar, parada ou estação final, destino. Tudo porque o amor não é um caminho. O amor, é uma estação do ano. Que se repete a cada nova estação, infinitamente. Quem se conhece no inverno, pode confundir o sentimento com o calor do café, da lareira, do solzinho. Há outros calores no inverno, como o do vinho. E nós não bebemos uma só taça... não brindamos nosso princípio... e o encanto se desfez. Hoje, restou na memória da história, por dentro de mim, apenas café. E a lembrança daquela rua por onde passamos somente de um lado. Do outro lado, havia pedrinhas de brilhantes. Não pude vê-las, porque eu estava do seu lado... e eu só olhava para você... 




segunda-feira, 17 de julho de 2017

Lança Curtas





Crônica Cotidiana 49




Os homens da família dele morreram. A maioria deles morreu; os restantes, são como se assim fosse. Ou omissos, ou mataram ele. Então as mulheres tomaram conta. E elas não podem ver um parente sozinho. Então, inventam coisas artificiais, para acasalar o ermitão urbano. “Vamos sair com as amigas”... “Vamos num aniversário”... “Você precisa ir ao cinema”... “Você tem que melhorar esse cabelo”. De tanta repetição, ficou com a última. Marcaram, lá na casa delas, o tal “tapa no visu”, como dizem os ‘contemporaneizinhos’. Ela, a cabeleireira, era uns cinco anos mais velha que ele. Olhos azuis, de enfeitiçar poetas amadores. Magra. Nariz aquilino, tinha prótese total superior. Mãos delicadas, mas não a ponto de enfeitiçar um especialista em cafunés. Só os dois, no banheiro. Ela pediu que ele ficasse sem camisa, ele nem ligava mais, mesmo acima do peso. Trocaram breves histórias, até lembraram que trabalharam vizinhos há algumas décadas. Ele disse que, do andar de baixo, lembrava-se de uma loira. Ela respondeu “era eu”. Ele não contou a outra lembrança, que ele não sabia recordar direito, a de que tinha algo de perverso naquela polaca tricenária. “Você ficava fumando na escada”, perguntou ele. Ela respondeu que é fumante até hoje, mas que não o fazia na escada, apenas lá nos fundos do salão. Noventa por cento de rejeição, àquela altura: fumo e dentadura. Não é questão de preconceito, mas pergunte a um arquiteto, se ele moraria numa construção sobre um aterro, ou se uma criminalista investiria em algum tipo de relação não profissional com seu cliente autor de latrocínio: haja Estocolmo. E haja analogia barata para tentar explicar coisas que a gente não conseguirá, jamais. No meio do serviço, ele disse a ela que faria, em breve, um transplante capilar. “Olha, vou te dizer como mulher e não como profissional: você é um homem bonito”. Na lata, ele disse que já tinha sido, hoje não mais. Cada um sabe se é bonito ou não. Cada um tem seus referenciais próprios de beleza. Mas fica muito feio – antiético até – tecer um tipo de comentário desses, diante da realidade. Teria Dona Jassa falado isso para conquistar o cliente Roque? Ou ela desejava apenas um sexo selvagem e descompromissado? Quem sabe ele estivesse somente cumprindo alguma cordialidade, etiqueta ou algo que o valha, diriam os mais ingênuos. Nada. Os dois estão numa selva. Existem gritos de acasalamento que soam baixinho. Mas, na selva, também tem floresta, onde há bichos que não admitem ser confundidos com presas. Será que está tão fácil assim? Basta um elogio para acabar em lençóis de cetim? Qual é o preço de um cruzamento animal? Sessenta reais? E isso resolve tudo? Serve também de catapulta para o amor? Essas perguntas são como chuva tropical. Não precisa questionar, a razão é sempre a mesma. Pessoas perdidas na selva, na cidade, nas redes sociais, todas em busca de alguém para amar ou para copular. Desespero. Competição, tiroteio, devaneio. Ele sentiu-se como um objeto. Homem objeto (podem rir, mulheres). Por ter submetido sua cabeça às mãos da caçadora, ela achou que o resto do corpo vinha junto, a um simples toque de sedução oral (achava). Aquilo não pareceu insulto, já que não foi a primeira vez, mas sim um lamento por parte dele, mais um. Deixou-a em casa, despediram-se com um até logo. Ela lhe enviou solicitação de amizade na rede, naquela noite. Ele aceitou, na manhã seguinte. Não tardou, chegaram fotos e figurinhas e gifs e o escambau na caixa de mensagens dele. Inteligente, bastou entrar na página dela, para ver o perfil de Dona Jassa. De imediato, ela havia compartilhado uma postagem de um bando de preconceituosos vibrando pela condenação em primeira instância de um político sem prova alguma: a rejeição instantânea, partiu potencialmente em direção ao infinito. Exclusão. Roque ficou (novamente) com a sensação de como se sente uma mulher ao ser molestada por um animal, claro que guardando as devidas proporções. É chato, é triste se falando em termos de coletividade. Gente assim tentando se misturar com outros que não os seus, diferença cívica gritante. Houve quem disse a ele “Mas por que você pelo menos não comeu ela?” Porque ele não é predador. Mora numa floresta. Quem faz de sua morada cotidiana um ambiente para relações bióticas, tem um quê considerável de animalesco: satisfação de instinto, mais nada. A evolução passa longe dali. Ele não soube, mas Jassa só queria rosetar, ou meter até morrer. Como aquelas pessoas que, depois do orgasmo, ou dormem de pronto ou vão correndo ao banheiro. Dormir para fingir felicidade ou banho para limpar a própria sujeira. Sexo sem sentido, é a banalização da ética. Um dia, ele viu algo parecido, escrito em algum lugar do passado. Um dia, de tanta floresta e menos selva, se chegará ao mar... 



quarta-feira, 5 de julho de 2017

Cordel SUL



Você viu,
    que mundo vil?
Não se pode mais oferecer,
    flores nem poesia
Quem receberia,
Acha que há intenção..
Flor,
    que é poesia sem dor
Poesia,
    que é flor sem cor
Ambas,
Não são elos
Nem laços
Tudo rompe-se no ato
Pois na alma de quem deu
    o último ponto
    ou a última pétala,
É o sinal que já morreu...