terça-feira, 4 de agosto de 2015

Terapêutica Urtigão


A dor de cabeça insiste. Persiste, quer morar em definitivo. Se é pela pressão, eu não sei. Ou pela visão, não importa. E não há ninguém por aqui pra dizer que dói. Nem ninguém pra ver que é dor. É numa hora dessas, mesmo raro, que eu tenho vontade de abandonar a solidão. Assumir a infidelidade e fazer questão de que ela saiba da traição. Pois solidão que se preze, não pode ter ciúme. Dane-se, ela. Eu só queria ir embora daqui. Embora desses anos tortos, vazios, ocos, escuros, silenciosos, ermos, desérticos de companhias quaisquer. Tempos e espaços que eu preencho com estórias, palavras, imaginações, viagens, ficções que sempre me trazem de volta ao fim que não tarda. A autonomia, a independência e todas as outras coisas de mundos individualistas, parecem desabar do meu alto pedestal erguido à consciência e lágrimas, quando retorna a dor de cabeça. Talvez um operador de branco dissesse que é dor referida do coração, ou ainda dor reflexa de algum órgão distante. Isto é, outros pontos neste organismo estariam irradiando sensações álgicas a manifestarem-se longe do seu lugar de origem. Não. Eu me conheço. Tenho saúde. E um bocado de cefaleias idiopáticas. Neosaldina, minha única droga fora a vida assim. O eremita paga muito caro por seu isolamento, o solitário mais ainda pelo seu distanciamento. É hora em que a paz descompensa. Sim, pois nem tudo no mundo é absoluto, as convicções também fazem parte do mundo. Relatividade que eu repito refletir em pontadas na nuca, fisgadas nas têmporas, pressões occipitais. Não dura muitos dias, no máximo uns três. Se eu tivesse um colo, talvez terminasse no mesmo dia. Mas eu sou convicto. Eu sou mundano. Sou relativo às vezes. Quase nunca. Mas é agora. Somente um colo, nada mais que isso. Um lugarzinho para deitar a fronte e ganhar a dádiva de um cafuné. Alguns minutos de toque e sensibilidade. Que eu receberia como força divina para voltar à minha soberana razão, de me manter sobrevivendo longe de emoções de toda natureza. Este, é o meu principal defeito: não tenho ambição afetiva. Meu desejo, é o mínimo que alguém poderia me dar. Se eu quisesse mais, talvez eu não tivesse dores de cabeça. Não escutaria dos homens de branco, diagnósticos sobre coração... 





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